Para analistas, expectativas de inflação em alta pressionam Copom.
Às vésperas da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, ganhou força no mercado a percepção de que o colegiado pode surpreender e elevar a Selic em 1 ponto percentual nesta semana. A aposta foi renovada ontem, após o Boletim Focus trazer mais uma rodada de deterioração das expectativas de inflação de 2022, que subiram de 3,70% para 3,78%.
Com esse cenário em mãos, o mercado futuro de juros apontava, no fechamento de ontem, 38% de chance de uma elevação de 1 ponto percentual na Selic amanhã – a taxa básica está em 3,5% anuais. No início da semana passada, essa possibilidade estava abaixo de 10%. O mercado de opções de Copom também sofreu impacto da mudança no humor dos agentes e, agora, já aponta para 17% de chance de a Selic subir para 4,5%. Na semana passada, a probabilidade desse cenário ocorrer era de 5%.
O economista-chefe da Vinland Capital, Aurelio Bicalho, diz ser “totalmente coerente” que o Copom analise a possibilidade de aumentar a Selic em 1 ponto nesta semana. “Dentro de um orçamento de três pontos percentuais de aperto até a Selic chegar ao nível neutro, caberia tranquilamente uma alta de 1 ponto agora e ajuste de igual magnitude em agosto para só depois reduzir o passo”, diz Bicalho, que projeta Selic em 7% no fim do atual ciclo de alta de juros.
Para Bicalho, o Copom deve concluir nesta reunião que não precisa mais de uma sinalização de ajuste parcial nos juros e que, para colocar as expectativas de inflação no centro da meta, “provavelmente vai ter de normalizar a taxa de juros”. Como a Selic está em 3,5% e o Copom terá uma confiança maior de que precisa ir para 6,5%, há um orçamento de três pontos percentuais de normalização. “Aí vem a estratégia de política monetária. Sem dúvida a soma de atividade mais forte e deterioração das expectativas vai fazer com que a alternativa de alta de 1 ponto seja debatida.”
Na pesquisa de semana passada do Valor com 104 instituições financeiras e consultorias, apenas a Sicredi Asset projetava uma alta de 1 ponto na taxa básica nesta semana. “Acreditamos que o Banco Central poderia acelerar esse ajuste, o que demonstraria sua disposição em fazer o esforço necessário para controlar a inflação e ajudaria a conter as expectativas de inflação de 2022, as quais estão se afastando da meta rapidamente”, diz Filipe Stona, economista da gestora.
Caso não adote uma medida agressiva, o profissional nota que o Copom pode estar em uma situação “ainda mais complicada” na próxima reunião, “dado que não vemos um vetor de desaceleração da inflação ou dos núcleos para os próximos meses, o que manteria as expectativas de 2022 subindo e se distanciando ainda mais da meta”.
Com o aumento das apostas em uma alta mais forte da Selic nesta semana, a taxa do DI para janeiro de 2022 subiu ontem de 5,295% para 5,34%; enquanto a taxa do DI para janeiro de 2027 caiu de 8,54% para 8,44%. Esse movimento tem se refletido no juro real. Cálculo do Valor Data a partir do swap de juro de 360 dias e das expectativas de inflação do Focus aponta que a taxa de juro real ex-ante atingiu 1,89% na semana passada, maior nível desde agosto de 2019.
Nesse contexto, a economista-chefe para Brasil do J.P. Morgan, Cassiana Fernandez, diz, em relatório enviado a clientes, que espera que o Copom aumente a Selic em 0,75 ponto amanhã. Ela acredita, ainda, que o comunicado da decisão “sairá com uma mensagem mais ‘hawkish’”, ou seja, alinhada a uma leitura mais dura e que aponte para a retirada de estímulos, em resposta à nova deterioração das expectativas inflacionárias.
“Não podemos descartar a possibilidade de que o BC force ainda mais o aperto e aumente a Selic em 1 ponto percentual nesta semana”, escreve a economista, no caso de uma avaliação de que as expectativas de inflação de 2022 estão “significativamente acima da meta”. Ela lembra, no relatório, que esse não é o cenário-base do J.P. Morgan, mas ressalta que “o BC já adotou essa estratégia quando iniciou o ciclo de normalização com alta de 0,75 em março”.
O economista-chefe da Truxt Investimentos, Arthur Carvalho, por sua vez, avalia que o Focus “deixou implícito que a dinâmica inflacionária está materialmente pior do que o esperado”. Ele, contudo, não vê chances elevadas de uma alta de 1 ponto na Selic nesta semana.
“Você tem um Banco Central que enxerga que o passo de 0,75 ponto já é agressivo. Desde o começo, ele disse que preferia fazer mais para o ciclo ser menor. Ele já sinalizava que via esse passo como agressivo”, nota. Para o economista da Truxt, embora as expectativas de inflação estejam se distanciando do centro da meta em 2022, o BC “não perdeu o controle completo do processo”.
Assim, Carvalho acredita que o mais importante na comunicação está na sinalização de que o ciclo de normalização não será parcial. “Se o BC acha que o ajuste parcial vai ancorar as expectativas, o mercado está dizendo que isso não será possível. É mais importante sinalizar que o tamanho do ciclo será diferente”, afirma. A Truxt vê a Selic em 6,5% no fim do ano, mas aponta que a chance de o juro entrar em um território restritivo “talvez já vire o cenário-base”.
FONTE: Valor Econômico Por Victor Rezende e Felipe Saturnino — De São Paulo