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NÚMERO DE PEDIDOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL PODE BATER RÉCORD NESTE ANO

30 de março de 2021

Expectativa é de alcançar o mesmo patamar de 2016, ano do impeachment de Dilma Rousseff.

A demanda por recuperações judiciais, represada em 2020, cresce de forma acelerada nos escritórios de advocacia e o volume de pedidos na Justiça pode bater recorde neste ano. A expectativa da consultoria Alvarez & Marsal é de que se alcance o mesmo patamar de 2016, quando as crises política e econômica desaguaram em forte recessão. Foram 1.865 caso naquele ano.

Os primeiros números divulgados pela Serasa Experian mostram a aceleração de pedidos. Em fevereiro, foram registrados 90, um crescimento de 11% em comparação ao mesmo mês do ano passado e de 83,7% em relação a janeiro. Os micro e pequenos negócios foram os responsáveis pela alavancagem do índice.

Os números do mês de março ainda não estão fechados. Mas advogados preveem um volume ainda maior. A projeção é feita com base no que se vê no dia a dia: a busca por bancas especializadas explodiu. O agravamento da pandemia coincidiu com o vencimento dos prazos das dívidas que foram renegociadas pelas empresas no ano passado. Grande parte desses pagamentos venceu neste mês ou vai vencer no próximo.

“Todo mundo empurrou no ano passado. Só que a situação não melhorou. Está até pior. Os empresários estão numa insegurança de fluxo de caixa muito grande”, diz Juliana Bumachar, sócia do escritório Bumachar.

O Moraes & Savaget Advogados, estuda, atualmente, 38 casos de companhias interessadas em recuperação — judicial e extrajudicial. São, principalmente, empresas de turismo, dos setores hoteleiro e de transportes. No ano passado, destaca o sócio da banca, André Moraes, só três processos foram protocolados.

“Eu preparei recuperações judiciais em 2020 que não foram ajuizadas por conta da facilidade que tivemos em negociar com os bancos. Isso aconteceu com mais de um cliente, entre eles uma grande rede de hotéis. Só que os prazos de carência que foram concedidos lá atrás estão acabando e os bancos não têm mais a mesma disposição para negociar”, ele afirma.

Em 2020, segundo a Alvarez & Marsal, foram apresentados, em todo o país, 1.176 pedidos de recuperação judicial. Essa quantidade ficou abaixo do registrado nos anos anteriores. Em 2019 haviam sido protocolados 1.387 e em 2018, 1.408.

O impacto que era esperado para 2020 não aconteceu porque, além das negociações privadas, dizem os especialistas, houve interferência do governo. O auxílio emergencial gerou consumo e as empresas puderam adiar o pagamento de tributos, reduzir salários e suspender contratos de trabalhadores. Conseguiram, ainda, nos bancos, juros mais baixos para novos financiamentos.

“Neste ano nós não vemos isso. O auxílio emergencial está desidratado, então a perspectiva de consumo é menor, e também não vemos a mesma quantidade de crédito subsidiado pelo governo”, diz o advogado Ricardo Siqueira, do escritório RSSA, que estuda entrar com quatro novos pedidos de recuperação judicial nos próximos dias.

Ele chama a atenção que mesmo as medidas de redução de jornada e salário, se novamente permitidas, não teriam o mesmo efeito do ano anterior. “Porque vêm acompanhadas da contrapartida de estabilidade. As empresas estão muito receosas em assumir esse compromisso sem saber quanto tempo vai durar a pandemia.”

Para especialistas, se criou uma bolha em 2020 — que, agora, está prestes a estourar. A Alvarez & Marsal prevê que, neste ano, o número de pedidos de recuperação judicial chegue a 1,8 mil. Poderá ser até maior, dependendo do desempenho do PIB. Só se atingiu esse patamar uma única vez em toda a existência da Lei de Recuperações e Falências: 2016, o ano do impeachment de Dilma Rousseff.

Eduardo Seixas, diretor de reestruturação da consultoria, acredita que o volume de pedidos de recuperação vai começar a ser visto, com mais força, em abril e maio. Principalmente por pequenas e médias empresas de serviço e comércio. “Aquelas que sobreviveram com as medidas do governo, agora, sem a retomada do mercado, provavelmente vão ter que entrar [com pedido de recuperação]”, diz.

Há um contingente, além disso, que ainda não está sendo contabilizado e, segundo advogados, também vai estourar. Trata-se das recuperações extrajudiciais. A nova Lei de Recuperações e Falências, que entrou em vigor no dia 23 de janeiro, facilitou esse processo.

Tanto na recuperação judicial como na extrajudicial, o devedor reúne os seus credores para negociar. Elabora-se um plano de pagamento — geralmente com prazo de carência, descontos e o parcelamento dos valores. Se a maioria dos credores que está submetida ao processo aprovar tais condições, todos os outros ficam vinculados e receberão o que lhes é devido da mesma forma.

Muda de uma modalidade para a outra, no entanto, a quantidade de credores envolvida. Na judicial, são submetidas todas as dívidas contraídas pela devedora até a data de início do processo (há exceção para débitos fiscais e valores com garantia fiduciária).

Já na extrajudicial, a devedora escolhe os credores com quem deseja negociar — o que a permite, por exemplo, poupar fornecedores, evitando se indispor com quem é essencial ao negócio. Essa negociação ocorre sem que haja interferência do Judiciário. Só depois de aprovado pelo grupo de credores, o plano de pagamento é levado para a homologação de um juiz.

Antes da nova lei, era necessária a concordância de 50% dos credores com quem a devedora escolheu negociar. Agora, se o devedor tiver um terço de aprovação do plano de pagamento, ele comunica o juiz e ganha um prazo de 90 dias para tentar convencer os demais — e chegar aos 50%. Durante esse período, as ações de cobrança contra ele ficam suspensas.

Se mesmo depois desse prazo o devedor não conseguir a aprovação, ele ainda pode entrar com pedido de recuperação judicial. “A extrajudicial é mais simples e os custos são menores. Não tem assembleia-geral de credores, nem precisa de administrador judicial”, diz Juliana Bumachar.

A busca por essa modalidade superaqueceu com a entrada em vigor da nova lei. “Agora está meio a meio [em comparação às recuperações judiciais]. Isso nunca aconteceu antes”, afirma a advogada. Só no escritório em que é sócia, o Bumachar Advogados Associados, estão sendo negociados três planos de recuperação extrajudicial.

Como a lei mudou há pouco tempo e as negociações entre devedores e credores ocorrem fora do Judiciário, só se terá ideia da proporção de recuperações extrajudiciais em maio ou junho — quando os planos de pagamento começarão a ser aprovados e levados para a homologação do juiz.

 

Fonte: Valor Econômico – Por Joice Bacelo, Valor — Rio

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