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O REGIMENTO NOVO DO CARF E SISTEMA DE PRECEDENTES

5 de março de 2024

A simplificação do procedimento para aprovação de súmulas, além otimizar os processos, aumentará a previsibilidade das decisões.

O Ministério da Fazenda, por meio da Portaria MF nº 1634, de dezembro de 2023, aprovou o novo Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que implementa modificações para, principalmente, aumentar a celeridade dos julgamentos e reduzir o estoque de processos. Publicado ainda em 2015, já era tempo de sua atualização para atender os anseios do Estado e da sociedade – apesar de alguns ajustes feitos por meio de portarias nesse período.

Por ser um órgão integrante do Ministério da Fazenda e não do Poder Judiciário, o Carf não precisa observar precedentes judiciais, ainda que vinculantes. Por isso, o regimento de 2015 já previa a necessidade de observar os precedentes definitivos e firmados em sede de Repercussão Geral, pelo Superior Tribunal Federal (STF), e de Recursos Repetitivos, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O novo regulamento eleva o precedente dos Tribunais Superiores ao mesmo patamar ocupado pelas súmulas internas do Carf, estabelecendo expressamente que não respeitar um precedente pode gerar a perda de mandato do conselheiro.  Por outro lado, o novo regimento condiciona que se trate de decisão transitada em julgado e traz previsões em linha com o complexo sistema de precedentes atual. A primeira delas consta no § único do artigo 99, que prevê dispensa de observância de precedente vinculante do STJ quando o STF reconhece a repercussão geral do mesmo tema. O objetivo é evitar que o Carf reproduza um entendimento do STJ, ainda que vinculante, que poderá ser revertido pelo STF – guinada jurisprudencial comum nas altas cortes brasileiras.

O regimento ainda permite que o presidente de Câmara profira uma decisão monocrática para não analisar um recurso, seja ele de ofício ou voluntário, apresentado contra uma decisão em primeira instância que aplicou um precedente do STF no contexto de controle concentrado de constitucionalidade, súmula vinculante do Supremo ou súmula do próprio Carf. Apesar de constar expressamente a sua aplicação para os recursos que não buscam afastar a incidência da súmula ou precedente vinculante, é imprescindível que os conselheiros presidentes tenham cautela, sobretudo pela ausência de previsão de qualquer recurso em face deste pronunciamento.

Ainda sobre este ponto, o novo regimento veda o sobrestamento de processos administrativos pela simples decisão de afetação de tema ao rito dos Recursos Repetitivos ou de Repercussão Geral, disposição que vai de encontro à proposição da comissão de juristas que elaborou projetos para modernização do processo tributário administrativo, na qual há a previsão de sobrestamento pela afetação.

Contudo, o regimento recém-publicado prevê a obrigatoriedade do sobrestamento quando há acórdão de mérito sob o rito de Repercussão Geral ou de Rito de Recursos Repetitivos não transitados em julgado. A medida é inovadora e tornará os julgamentos do Carf mais efetivos, além de evitar judicialização desnecessária.

Cabe ainda tratar das inovações no processo de elaboração de súmulas pelo Carf. Antes, a proposição de súmula deveria ser encaminhada ao presidente do órgão, instruída com pelo menos cinco decisões. Ele então convocaria as sessões anuais para apreciação e aprovação dos enunciados.

No entanto, as diversas intercorrências enfrentadas pelo Carf nos últimos anos impossibilitaram essas sessões e a edição de novas súmulas. Por isso, as mais recentes tiveram seus enunciados apreciados e aprovados em sessão ocorrida em agosto de 2021.

A solução proposta no novo regulamento é a possibilidade de proposição e aprovação das súmulas pelas turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais em sessão de julgamentos ordinária, limitada à sua respectiva competência. O dispositivo ainda reduziu o número de acórdãos para três, conforme o artigo 124.

Segundo o artigo 125 do novo regimento, os conselheiros das turmas ordinárias ainda terão a prerrogativa de propor, em seu próprio colegiado, o envio de proposição de súmula à sua respectiva Câmara Superior, a quem compete apreciar e aprovar o tema.

Cabe mencionar que, além das sessões de julgamentos presenciais, por videoconferência ou híbridas, há a previsão de que ocorram sessões virtuais assíncronas de cinco dias úteis, nas quais serão depositados os votos e as eventuais sustentações orais. A inspiração para esse modelo é o Plenário Virtual do STF.

Outra mudança significativa é o aumento do tempo máximo de exercício de mandatos pelos conselheiros, que passará a ser de oito anos – com exceção para presidentes de turma ou de câmara, com tempo máximo de permanência de doze anos.

Apesar de existir espaço para melhorias, as modificações estão em linha com a complexidade do sistema de precedentes brasileiro e aumentarão a celeridade e efetividade dos julgamentos do Carf. A simplificação do procedimento para aprovação de súmulas, além otimizar os processos, aumentará a previsibilidade das decisões.

Contudo, caberá aos conselheiros do Carf, sobretudo os presidentes de câmara, prudência nos julgamentos monocráticos. Isso porque a aplicação indiscriminada do instrumento para não conhecer de recursos dos contribuintes diminuirá o estoque de processos do órgão ao custo do congestionamento do judiciário, notadamente pela ausência de recurso administrativo cabível.

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR RAFAEL GREGORIN E THIAGO SILVEIRA

 

 

 

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