A LC 214 redefine a responsabilidade solidária tributária, exigindo boa-fé dos contribuintes, mas gera debates sobre limites e impactos no ambiente de negócios.
A regulamentação da reforma tributária pela EC 132/23 trouxe consigo debates intensos sobre as novas hipóteses de responsabilidade solidária previstas no então PLP 68/24, convertido na LC 214. Essas inovações prometem transformar a relação entre contribuintes e a administração tributária, ao mesmo tempo que levantam preocupações jurídicas importantes.
O texto final da lei complementar 214 introduziu no art. 24, V, alíneas “a” e “b” disposições que atribuem responsabilidade solidária a pessoas físicas e jurídicas que, por ação ou omissão, concorram para o descumprimento de obrigações tributárias. Entre os exemplos trazidos pela pelo próprio texto legal, estão a ocultação do valor de operações tributáveis e o abuso da personalidade jurídica, que permitem a aplicação de penalidades em casos de desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Importante pontuar que “não enseja responsabilidade solidária a mera existência de grupo econômico quando inexistente qualquer ação ou omissão que se enquadre no disposto no inciso V” (art. 214, § 3° da mesma LC), mencionado acima. Pelo menos no âmbito da CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços e do IBS – Imposto sobre Bens e Serviços, a LC 214 resolveu uma antiga polêmica: a responsabilidade tributária solidária tão somente pela existência de grupo econômico. Isso quer dizer que o simples pertencimento a um grupo econômico não justificará a responsabilidade solidária – como dissemos, pelo menos para esses novos tributos.
Apesar de a norma não delegar aos particulares o dever de fiscalizar e denunciar, ela exige um comportamento de boa-fé e colaboração no cumprimento das obrigações fiscais dos seus fornecedores e clientes, o que tem sido visto como um avanço na busca por maior regularidade fiscal. No entanto, o texto legal demanda cautela para evitar violações à razoabilidade e à capacidade contributiva.
A controvérsia reside principalmente na extensão das obrigações impostas aos responsáveis solidários e na necessidade de comprovar o dolo nas ações que contribuam para fraudes fiscais. Caso contrário, a aplicação indiscriminada da responsabilidade tributária solidária pode implicar inconstitucionalidades e prejudicar o ambiente de negócios, repetindo o que já existe hoje em alguns casos relativos à tributação da renda e mesmo do ICMS.
Portanto, a regulamentação precisa equilibrar o interesse público na arrecadação com a proteção dos direitos dos contribuintes, garantindo que a inovação legislativa seja um instrumento de justiça fiscal e não de retrocesso jurídico.
FONTE: MIGALHAS – POR EDISON CARLOS FERNANDES E NATHALIA REIS