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CARF GARANTE DIREITO A CRÉDITOS DE PIS E COFINS SOBRE PUBLICIDADE

17 de janeiro de 2025

Decisão, da 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção, beneficia a Netshoes e cancela parte de auto de infração de R$ 85,6 milhões.

Uma recente decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) garantiu à Netshoes, do Magazine Luiza, créditos de PIS e Cofins sobre gastos com publicidade na internet. Por maioria, a 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção considerou o serviço como insumo essencial, o que gera o direito ao benefício. O entendimento reforma parte do auto de infração de R$ 85,6 milhões contra a empresa, referente aos anos de 2014 e 2015. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) recorreu da decisão.

O acórdão, publicado no início do mês, destoa de alguns precedentes do Carf e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), normalmente contra os contribuintes. Em 2018, o STJ definiu, em recurso repetitivo (que vincula todo o Judiciário), que o conceito de insumo deve ser analisado “à luz dos critérios de essencialidade ou relevância”, considerando a importância de determinado item, bem ou serviço para a atividade econômica do contribuinte. No caso concreto, da Anhambi Alimentos, porém, negou o direito ao crédito sobre insumos, entre eles, o da publicidade (REsp 1221170).

Em outro julgamento, de uma franqueada da Hering, os ministros também negaram a possibilidade de creditamento, pois não seria essencial à atividade. Decidiram que, da mesma forma que não são fundamentais despesas com publicidade para empresa do ramo alimentício, esses custos tampouco são imprescindíveis ao processo produtivo de empresa que atua no ramo de vestuário, sendo irrelevante haver contrato de franquia (REsp 1437025).

O Supremo Tribunal Federal (STF) também já se debruçou sobre a matéria, mas entendeu que seria infraconstitucional, ou seja, a palavra final fica com o STJ (RE 841979). No Carf, empresas como a Visa, Lojas Insinuante (atual Ricardo Eletro), Natura, Subway e a administradora de consórcio Honda conseguiram decisões favoráveis envolvendo o insumo publicidade. Já a Netflix e a Flora Produtos de Higiene e Limpeza, da J&F Participações, não tiveram o mesmo êxito.

O tema sempre é analisado caso a caso e os contribuintes saem vitoriosos quando conseguem demonstrar a essencialidade daquele insumo para o modelo de negócio. A discussão envolve o PIS e a Cofins no regime não cumulativo, para empresas que apuram os tributos no lucro real – que tenham faturamento anual acima de R$ 78 milhões.

Como a operação da Netshoes é 100% online, o tribunal administrativo entendeu que a publicidade é imprescindível para a captação da clientela, pois não há loja física. “Portanto, existe apenas uma única forma de a recorrente atrair novos clientes e gerar novas receitas: o investimento em publicidade, propaganda e marketing”, afirma a relatora do caso, Flávia Sales Campos Vale (processo nº 19311.720262/2017- 65).

A conselheira levou em consideração que a marca oferece “soluções integradas” aos clientes e “desenvolve atividade de alta complexidade que envolve a produção de mercadorias e a prestação de serviços”. Por isso, integra a cadeia produtiva, nas etapas subsequentes à fabricação dos produtos, como na separação de mercadorias, controle de estoque e logística. O crédito de PIS/Cofins autorizado é de 9,25% sobre os custos com publicidade.

O tributarista Paulo Coviello Filho, sócio de Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados, avalia o acórdão como positivo, pois os contribuintes vinham perdendo as discussões sobre o tema. “Para o marketplace, os gastos com publicidade são essenciais porque impulsionam a mercadoria. É uma maneira de conectar as partes”, diz Coviello.

A decisão, contudo, acrescenta, não deve valer para todas as plataformas de ecommerce. “A discussão é muito peculiar e tem que se analisar cada empresa, não basta só atuar na internet para poder tomar o crédito. Tem que dar um passo além, provar, a partir do objeto social dela, como aquele gasto é essencial para o modelo de negócio”, afirma.

No caso da Insinuante, lembra, foi considerado que os contratos com fornecedores tinha a obrigação da atividade de marketing. No da Visa, foi levado em conta o modelo de intermediação que viabiliza os pagamentos. Já no da Netflix, apesar de também ser empresa digital, o marketing era algo posterior à prestação do serviço, que é o streaming.

Coviello discorda, contudo, de outro trecho do acórdão, em que o Carf vedou o aproveitamento de créditos da taxa de administração de cartão de crédito, por não entender que é insumo. “Essa empresa, assim como qualquer marketplace, só vende pela internet, então ou se paga no PIX, que é uma ferramenta criada agora e na época não existia, ou cartão de crédito. Me parece que pela lógica de considerar o crédito de publicidade, também tinha que considerar os gastos com cartão de crédito”, completa.

Segundo Thais De Laurentiis, sócia Rivitti e Dias Advogados e ex-conselheira do Carf, a questão dos insumos é um dos temas que mais gera contencioso. Mesmo após a decisão do STJ, que detalhou o que é insumo, é preciso analisar se a empresa é comercial ou não, isto é, se produz ou presta serviço, pois isso é o que diz a lei. “É um passo atrás de toda a discussão do que é ou não insumo. É ver se a empresa produz ou presta serviço, pois só assim ela vai poder ter direito ao crédito.”

A jurisprudência do Carf é no sentido de que se a empresa for comercial e apenas revender produtos, não tem esse direito. Para Thais, a Netshoes é comercial, mas levou-se em conta a logística por trás do gerenciamento de produtos e que a publicidade é essencial para o relacionamento com os clientes. “A logística específica de e-commerce afasta a empresa do conceito meramente comercial”, afirma. “Esse é o ponto mais relevante do acórdão.”

Para Thais, “é uma decisão muito favorável e inovadora, mas que tem que ser acompanhada com cuidado, justamente porque é fora do padrão”. Ressalta que “se privasse a Netshoes dos gastos com publicidade, o negócio ficaria prejudicado na quantidade, qualidade e suficiência.”

Em nota ao Valor , a PGFN diz que é preciso estabelecer com precisão as razões que embasaram as decisões do Carf para depois definir seu posicionamento. Defende que para o contribuinte que exerce atividade comercial, “possui legitimidade para apurar crédito conforme o estabelecido no artigo 3º, I, IV, V, VII e IX da Lei nº 10.637/2002 (assim como seus dispositivos equivalentes na Lei nº 10.833/2003)”. “É importante destacar, no entanto, que este benefício não se estende às circunstâncias previstas no artigo 3º, II das mesmas leis, que tratam de insumos”, afirma.

A Netshoes, também por nota, diz que “sempre acreditou em suas práticas de mercado” e que a decisão “reafirma o melhor entendimento jurídico da legislação, que válida a importância destes tipos de despesas para o varejo de e-commerce”.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR MARCELA VILLAR — DE SÃO PAULO

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