Em petições iniciais de ações de repetição de indébito de tributos era muito comum a juntada de milhares de guias de pagamento para a comprovação dos recolhimentos a serem devolvidos.
Desde 2009 o STJ pacificou o entendimento de que bastaria a juntada de um único recolhimento para comprovar a condição de contribuinte do Autor e os outros recolhimentos poderiam ser juntados somente na fase de liquidação do julgado, conforme se extrai do tema 115 do STJ:
“Mostra-se suficiente para autorizar o pleito repetitório a juntada de apenas um comprovante de pagamento da taxa de iluminação pública, pois isso demonstra que era suportada pelo contribuinte uma exação que veio a ser declarada inconstitucional. A definição dos valores exatos objeto de devolução será feita por liquidação de sentença, na qual obrigatoriamente deverá ocorrer a demonstração do quantum recolhido indevidamente.”
Já na delimitação do tema 118 do STJ restou estabelecido:
“a) tratando-se de mandado de segurança impetrado com vistas a declarar o direito à compensação tributária, em virtude do reconhecimento da ilegalidade ou inconstitucionalidade da anterior exigência da exação, independentemente da apuração dos respectivos valores, é suficiente, para esse efeito, a comprovação cabal de que o impetrante ocupa a posição de credor tributário, visto que os comprovantes de recolhimento indevido serão exigidos posteriormente, na esfera administrativa, quando o procedimento de compensação for submetido à verificação pelo fisco; e
b)tratando-se de mandado de segurança com vistas a obter juízo específico sobre as parcelas a serem compensadas, com efetiva alegação da liquidez e certeza dos créditos, ou, ainda, na hipótese em que os efeitos da sentença supõem a efetiva homologação da compensação a ser realizada, o crédito do contribuinte depende de quantificação, de modo que a inexistência de comprovação suficiente dos valores indevidamente recolhidos representa a ausência de prova pré-constituída indispensável à propositura da ação mandamental.”
Desse modo só devem ser juntados na inicial todos os comprovantes de pagamento quando se pretende a obtenção de um juízo específico sobre as parcelas a serem compensadas ou a homologação de uma compensação realizada. Isto é, quando se quer que o judiciário ateste a efetiva existência, certeza e liquidez do crédito a ser compensado.
Com isso ganhou-se agilidade no ajuizamento das ações, já que não mais seria necessário juntar todos os comprovantes e durante a tramitação do feito o Autor teria tempo para levantar e organizar a comprovação de todos os recolhimentos.
Entretanto, alguns julgados ainda continuam prevendo que somente os recolhimentos comprovados nos autos seriam passíveis de repetição.
Em recente julgado o STJ decidiu, com base na instrumentalidade do processo, que tal previsão transitada em julgado da comprovação prévia poderia ser afastada no caso do Ente Público reconhecer a existência do pagamento, que deixou de ser comprovado pelo contribuinte nos autos:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS 489 E 1.022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. TÍTULO JUDICIAL QUE RECONHECE O DIREITO À RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS CUJO RECOLHIMENTO INDEVIDO TENHA SIDO COMPROVADO NOS AUTOS. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS NÃO COMPROVADAS, MAS RECONHECIDAS PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA COMO PAGAS. ATO ADMINISTRATIVO REVESTIDO DE FÉ PÚBLICA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE, LEGITIMIDADE E VERACIDADE. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JULGAMENTO DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO. CABIMENTO. PROVIMENTO NEGADO.
O julgamento do STJ está correto, já que no processo o contribuinte afirmou que recolheu as exações e o Fisco comprovou tais recolhimentos documentalmente nos autos. Logo, não faz sentido o Entre Público não querer devolver os valores sob a alegação de que o autor não juntou a comprovação dos recolhimentos.
Desse modo, o entendimento do STJ parece atender aos princípios da economia e celeridade processual, vedando o enriquecimento ilícito do erário em detrimento do contribuinte, que efetuou o pagamento de tributos indevidos.
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1 Esse é o entendimento que prevalece no STJ até os dias de hoje: AgInt no AREsp 2.450.544/MG, Relator ministro Mauro Campbell Marques, 2ª turma, julgado em 22/4/24, DJe de 25/4/24.
FONTE: MIGALHAS – POR ROGERIO MOLLICA