Medida prevista para evitar fraude na tomada de crédito fiscal impactará o fluxo de caixa
Conforme vão progredindo e se aprofundando os estudos e os debates sobre a reforma tributária, alguns “efeitos colaterais” (será que poderíamos chamar “externalidades”?) começam a aparecer. Aberta a cortina do palco, verificamos que a escolha política, tanto do Poder Executivo quanto do Congresso Nacional, foi evidentemente a favor da arrecadação, em detrimento da satisfatória neutralidade – entendida como a ausência de interferência da legislação tributária sobre a tomada de decisão nos negócios empresariais.
É certo que a neutralidade tributária absoluta é uma ilusão. Os agentes econômicos sempre vão (ou deveriam) incluir os impactos tributários no planejamento dos seus negócios e se guiarão considerando esses impactos. Acontece que a regulamentação da reforma tributária acaba por contrariar seus louváveis princípios gerais.
Em razão do espaço, foco em um único “efeito colateral”: o impacto das condições para a tomada do crédito fiscal, no âmbito da não cumulatividade, na gestão do caixa das empresas.
Atualmente, a empresa cliente escritura o crédito dos tributos não cumulativos (IPI, ICMS, PIS e Cofins) no momento da operação comercial, independentemente das condições de pactuação do negócio em si. Acontece que a empresa fornecedora tem prazo legal para o recolhimento dos tributos, que proporcionaram a tomada de crédito fiscal pela cliente. Durante esse prazo, que pode superar 30 ou 40 dias, a fornecedora legitimamente financia e gerencia seu fluxo de caixa.
Com as regras atuais, especificamente as condições para tomada do crédito fiscal, em razão da não cumulatividade, a saber: efetivo recolhimento do imposto incidente sobre a operação, quando for possível “antecipar” o seu pagamento (artigo 156-A, § 5° da Constituição Federal com a redação dada pela Emenda Constitucional n° 132), a fornecedora perde esse “instrumento” legítimo de financiamento.
No caso do “split payment” (recolhimento do imposto por meio de liquidação financeira da operação), esse impacto no caixa das empresas é mais evidente. Pensem no seguinte exemplo: a cliente adquire mercadorias a prazo, para liquidação da operação em seis parcelas mensais; nesse caso, a fornecedora receberá o preço durante esse prazo e de maneira parcela, embora tenha emitido a nota fiscal antes mesmo da entrega; utilizado o “split payment”, a cliente terá direito ao crédito fiscal apenas e tão somente quando do pagamento de cada parcela à fornecedora.
Concluem-se de maneira evidente duas coisas: a opção pela arrecadação tributária e uma fenda na neutralidade tributária.
FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR EDISON FERNANDES