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DO STF AO COMITÊ GESTOR DO IBS

30 de setembro de 2024

ADI 7276 e a nova fronteira do acesso a dados financeiros pelos entes subnacionais na reforma tributária

O Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7276, estabeleceu um importante precedente acerca do acesso a informações financeiras por entes federativos. A decisão, que declarou a constitucionalidade de cláusulas do Convênio ICMS 134/2016 do Confaz, reafirmou o princípio da isonomia federativa e abriu caminho para uma interpretação mais abrangente do artigo 5º da Lei Complementar 105/2001.

A ADI 7276, ajuizada pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), questionava a constitucionalidade de dispositivos que impunham às instituições financeiras a obrigação de fornecer informações de clientes às unidades federadas.

O STF, por maioria, julgou improcedente a ação, fundamentando-se na necessidade de uma fiscalização tributária eficiente e na impossibilidade de se criar distinções injustificadas entre os entes federados no acesso a informações fiscais.

A decisão do Supremo tem implicações significativas para os municípios, que historicamente enfrentaram limitações no acesso sistemático a informações financeiras. No contexto municipal, a Declaração de Informações de Meios de Pagamento (DIMP) representa um instrumento crucial para a fiscalização tributária. A decisão do STF na ADI 7276 legitima a retomada da exigência da DIMP municipal, anteriormente suspensa por medidas judiciais.

A possibilidade de estados e municípios criarem obrigações acessórias análogas à e-Financeira da Receita Federal é um desdobramento natural da decisão. Contudo, é imperativo que essa faculdade seja exercida com cautela, observando-se as limitações decorrentes das competências tributárias específicas de cada ente federativo.

A amplitude do acesso a informações financeiras por estados e municípios deve ser cuidadosamente delimitada, considerando suas competências tributárias e fiscalizatórias. Diferentemente da União, que possui competência para tributar a renda e as operações financeiras, os entes subnacionais têm um escopo mais restrito. No caso dos municípios, por exemplo, o foco recai principalmente sobre o Imposto Sobre Serviços (ISS).

Não obstante, é crucial reconhecer que a eficácia da fiscalização tributária municipal pode demandar acesso a informações de pessoas físicas em determinadas circunstâncias. Isso se justifica pela crescente complexidade das transações financeiras e pela utilização de contas pessoais para atividades empresariais, especialmente no contexto de microempreendedores individuais e, futuramente, nanoempreendedores, conforme previsto na reforma tributária.

A decisão do STF, ao dar interpretação conforme à Constituição ao artigo 5º da Lei Complementar 105/2001, estendendo sua aplicação aos estados e municípios, reforça o modelo federativo cooperativo e não hierarquizado. Essa interpretação é fundamental para garantir que todos os entes federativos disponham de instrumentos equivalentes para exercer suas competências tributárias.

No contexto da reforma tributária, emerge a questão do acesso a informações financeiras pelo Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A criação deste órgão, prevista no PLP 108/2024, suscita debates sobre a extensão de suas competências fiscalizatórias e, consequentemente, sobre seu acesso a dados financeiros.

É imperativo considerar que, no âmbito da reforma tributária, a adoção do princípio da tributação no destino altera significativamente o escopo geográfico do acesso a informações financeiras pelos municípios e estados. Uma empresa pode realizar operações em todo o país, afetando a arrecadação de diversos municípios onde estão localizados os consumidores finais, mesmo que não tenha presença física nesses locais. Essa realidade demanda uma reavaliação do escopo geográfico para o acesso a dados financeiros pelos entes subnacionais.

Nesse cenário, o Comitê Gestor emerge como a entidade mais adequada para receber e gerenciar essas informações em nível nacional. A base ampla do IBS, cuja competência será compartilhada e exercida no âmbito do Comitê Gestor, justifica uma amplitude de acesso a informações financeiras similar à da União. Inclusive, operações financeiras atualmente tributadas pelo IOF serão abrangidas pelo IBS através de regimes específicos.

Portanto, no contexto do IBS, o Comitê Gestor, com sua competência nacional, possui legitimidade para instituir uma obrigação tributária acessória análoga à e-Financeira da União. Para solidificar essa prerrogativa, seria prudente incluir no PLP 108 um dispositivo análogo ao artigo 5º da Lei Complementar 105/2001, legitimando explicitamente o acesso do Comitê Gestor a dados financeiros na mesma amplitude que a União.

É fundamental que esse acesso seja regulamentado de forma a respeitar os princípios da proporcionalidade e da necessidade. As informações acessadas pelo Comitê Gestor devem ser estritamente relacionadas às suas competências fiscalizatórias, evitando-se a coleta indiscriminada de dados.

Em conclusão, a decisão do STF na ADI 7276 representa um marco significativo na equalização das prerrogativas fiscalizatórias entre os entes federativos. Simultaneamente, ela impõe desafios na delimitação do escopo de acesso a informações financeiras por cada ente, considerando suas competências específicas.

No contexto da reforma tributária, é imperativo que a legislação complementar aborde de forma clara e precisa as competências do Comitê Gestor no acesso e tratamento de dados financeiros, garantindo-lhe os instrumentos necessários para uma fiscalização eficiente em escala nacional, sem descuidar da proteção aos direitos fundamentais dos contribuintes. A inclusão de dispositivos específicos no PLP 108 será crucial para estabelecer um framework legal robusto e adequado às novas realidades tributárias do país.

FONTE: JOTA – POR RAFAEL VILCHES

 

 

 

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