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CARF APROVA SÚMULA SOBRE SOLIDARIEDADE DE GRUPO ECONÔMICO

27 de setembro de 2024

Texto que trata de previdenciárias foi considerado polêmico por especialistas por afrontar decisões dos tribunais superiores.

Integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) aprovaram 16 súmulas, de um total de 17 propostas, para orientar os julgamentos do órgão. A mais polêmica define que empresas do mesmo grupo econômico são responsáveis solidárias por obrigações previdenciárias. Os textos foram votados em sessão extraordinária realizada ontem e começam a valer após a publicação no Diário Oficial da União.

Tributaristas apontam que essa súmula sobre obrigações previdenciárias afronta entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), contraria jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, por isso, deve aumentar a judicialização.

A proposta foi aprovada por sete votos a três, com a adesão de conselheiros representantes dos contribuintes. O texto afirma que “as empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem solidariamente pelo cumprimento das obrigações previstas na legislação previdenciária, nos termos do artigo 30, inciso IX, da Lei nº 8.212/1991, c/c o artigo 124, inciso II, do CTN, sem necessidade de o Fisco demonstrar o interesse comum a que alude o artigo 124, inciso I, do CTN”.

Caio Quintella, ex-conselheiro e sócio da Nader Quintella Advogados, diz que os problemas começam pelo número de acórdãos que basearam a edição da súmula:  apenas três, o mínimo legal exigido pelo Regimento Interno do Carf, a partir de uma alteração feita no ano de 2023, criticada por especialistas.

Dos três acórdãos analisados para a proposição da súmula, apenas um deles trata de responsabilidade objetiva de grupos econômicos pelo pagamento de débitos previdenciários. Os outros, afirmam tributaristas, pressupõem a prática de ato ilícito para que isso ocorra.

Flávio Molinari, advogado tributarista sócio do Collavini Advogados, diz que os processos apontados como precedentes são discutíveis. “Os casos concretos destacam a necessidade de considerar o contexto fático e os elementos de prova para configurar o interesse comum entre as pessoas jurídicas”, afirma.

Segundo a súmula aprovada, no entanto, basta a mera constatação de grupo econômico pelo colegiado em que o processo se originou para que uma empresa possa ser responsabilizada pelas dívidas de outra.

A advogada Maria Rita Ferragut, líder de tributário do Trench Rossi Watanabe, destaca que no Tema 13 de repercussão geral, que transitou em julgado (não cabe mais recurso) em 2014, o STF definiu que os sócios da empresa não podiam ser responsabilizados, com seu patrimônio pessoal, pelas dívidas previdenciárias da pessoa jurídica. O caso, acrescenta, não tratava de empresas do mesmo grupo, mas a lógica por trás do entendimento é a mesma.

No STJ, de acordo com especialistas, a jurisprudência também é consolidada há muitos anos no sentido de afirmar que a composição de grupo econômico, por si só, não basta para decretar a responsabilidade solidária. Em 2011, a 1ª Seção assentou que já era entendimento majoritário nas turmas que “o fato de haver pessoas jurídicas que pertençam ao mesmo grupo econômico, por si só, não enseja a responsabilidade solidária, na forma prevista no artigo 124 do CTN” (EREsp 859616).

O entendimento foi reforçado em agravos em um precedente do ano de 2013 no qual a 2ª Turma considerou correto “o entendimento de que, nos termos do artigo 124 do CTN, existe responsabilidade tributária solidária entre empresas de um mesmo grupo econômico apenas quando ambas realizem conjuntamente a situação configuradora do fato gerador, não bastando o mero interesse econômico na consecução de referida situação” (ARESP 429.923).

Para Maria Rita Ferragut, a aprovação dessa súmula vai gerar um imenso contencioso. “Certamente os contribuintes irão discutir essa matéria no Judiciário e ganhar. A decisão vai totalmente na contramão da redução de litigiosidade que estamos tanto defendendo.”

Outra súmula aprovada com potencial para gerar problemas no Judiciário é a que prevê critérios fixos para a geração de créditos do PIS e Cofins não cumulativos no transporte de produtos entre estabelecimentos de uma mesma empresa.

Diz o enunciado, aprovado por sete votos a três: “Os gastos com fretes relativos ao transporte de produtos acabados entre estabelecimentos da empresa não geram créditos de contribuição para o PIS/Pasep e de Cofins não cumulativas”.

Caio Quintella entende que a redação restringe a análise das especificidades de cada processo. “Vai-se criar um enrijecimento nos julgamentos incompatível com a demandas de análise caso a caso da cadeia na qual ocorre tal creditamento pelo transporte”, afirma o especialista.

Durante o debate, conselheiros contrários à aprovação da proposta levantaram o mesmo argumento, destacando que os insumos de PIS e Cofins são vinculados aos processos produtivos do contribuinte. Assim, não seria possível dizer que o frete de produto acabado é irrelevante para o processo produtivo. No caso da produção de ouro, por exemplo, citado pelo conselheiro Oswaldo Castro Neto, o transporte do minério para um depósito seguro faz parte da cadeia de produção.

Adriana Stamato, sócia da área tributária do Trench Rossi Watanabe, também defende que o frete de produtos acabados deveria ser creditável, especialmente na indústria. “O fato de o produto já estar pronto não significa que acabou seu ciclo de produção, pois isso poderia ser entendido como estar ‘pronto para venda’ e isso só irá ocorrer quando o pronto estiver no local a partir de onde ele será vendido ao cliente”, afirma. “Para chegar a esse lugar, é claro que precisa ser transportado e, nesse sentido, o valor do frete deveria ser considerado como creditável para prestigiar o princípio da não cumulatividade”, acrescenta.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR LUIZA CALEGARI — DE SÃO PAULO

 

 

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