Uma proposta favorável ao fisco sobre cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física foi rejeitada.
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) aprovou, nesta quinta-feira (26/9), 16 novos enunciados de súmulas, incluindo textos sobre matéria aduaneira, responsabilidade solidária e créditos com gastos de fretes. No entanto, foi rejeitada uma proposta favorável ao fisco sobre cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física.
O enunciado refutado dizia ser incabível afastar a presunção de omissão de receitas ou rendimentos, para fins de exigência de IRPF, nos casos em que não for comprovada a origem dos depósitos, mesmo que o contribuinte exerça exclusivamente a atividade rural. De forma sucinta e sem entrar no mérito, os conselheiros ponderaram que o texto da proposta precisaria de readequação em sua redação. Ao JOTA, entretanto, uma conselheira afirmou que o texto deve ser corrigido e submetido novamente à votação em outro momento.
Dentre os destaques aprovados estão algumas súmulas consideradas desfavoráveis aos contribuintes. É o caso do texto que estabelece que as empresas que integram o mesmo grupo econômico respondem, de forma solidária, pelo cumprimento das obrigações previdenciárias, sem a necessidade de o fisco demonstrar o interesse em comum.
Também despertava a preocupação dos contribuintes e foi aprovado o enunciado que trata da impossibilidade de tomada de créditos do PIS e da Cofins sobre gastos com fretes relativos ao transporte de produtos acabados entre estabelecimentos da empresa. O texto foi apreciado pela 3ª Turma da Câmara Superior.
O Pleno aprovou, ainda, uma súmula que afasta a equiparação da compensação ao pagamento para fins de aplicação do instituto da denúncia espontânea, previsto no artigo 138 do Código Tributário Nacional.
A maioria dos textos foi aprovada por maioria de votos e agora passará a vincular o tribunal e as delegacias regionais de julgamento (DRJs), 1ª instância da esfera administrativa.
Pleno
O Pleno aprovou duas súmulas. A primeira trata do início da contagem do prazo para homologação tácita de compensação declarada pelo sujeito passivo, conforme o parágrafo 5º do artigo 74 da Lei 9.430/96. Neste caso, a aprovação se deu por maioria de 25 votos, ficando vencido apenas o conselheiro Oswaldo Gonçalves de Castro Neto.
A segunda súmula trata da impossibilidade de equiparar a compensação ao pagamento para fins de aplicação do instituto da denúncia espontânea, previsto no artigo 138 do Código Tributário Nacional. O enunciado foi aprovado com placar de 22 votos a favor e quatro contra. Ao votar contra a aprovação do enunciado, o conselheiro Jandir Dalle Lucca destacou que não há jurisprudência consolidada nem no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou no Carf para permitir a edição de súmula.
Outros três conselheiros também votaram contrariamente: Heldo Jorge dos Santos Pereira Jr., Luis Henrique Marotti Toseli e Maria Carolina Maldonado Mendonça Kraljevic.
1ª Turma da Câmara Superior
Por unanimidade, a 1ª Seção aprovou a única súmula sugerida para o colegiado. O texto dispõe sobre a possibilidade de o fisco confirmar os requisitos legais de dedução de retenções na fonte e estimativas mensais na apuração do saldo negativo de IRPJ e CSLL, no prazo de cinco anos (prazo da homologação tácita). O presidente do colegiado, conselheiro Fernando Brasil de Oliveira, apontou que o tema é recorrentemente julgado pelo colegiado de forma unânime e “não envolve controvérsia sobre base de cálculo”.
2ª Turma da Câmara Superior
Das 12 súmulas analisadas pela 2ª Turma da Câmara Superior, apenas uma foi rejeitada, por necessidade de ajustes na redação. O texto refutado dizia ser incabível afastar a aplicação da presunção estabelecida no artigo 42 da Lei 9.430/1996, quando não comprovada a origem dos depósitos, ainda que o contribuinte exerça exclusivamente a atividade rural. A rejeição foi unânime.
“Nos acórdãos apontados como precedentes, a tese do contribuinte era de que a presunção do artigo 42 da Lei 9430/1996 deveria ser afastada quando ele exerce atividade rural, aplicando-se a tributação da atividade rural. O dispositivo prevê tributar como renda o total dos depósitos de origem não comprovada que o fisco identificar”, explicou Livia Germano, sócia do escritório Barros Pimentel Advogados.
O JOTA apurou que o texto deve ser revisado e apresentado novamente, com correções, e tende a ser aprovado. A questão central para a rejeição do enunciado foi a redação do texto, e não o mérito da discussão. Atualmente, a jurisprudência do Carf é desfavorável ao contribuinte no tema. A última vez que o conselho rejeitou uma súmula foi em 2018, com um texto que proibiria o aproveitamento fiscal de ágio interno.
Entre os textos aprovados pela 2ª Turma, o mais ruidoso é o que aborda a responsabilidade solidária de empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico. Ao se manifestar favorável à aprovação, o conselheiro Maurício Nogueira Righetti destacou as hipóteses em que o texto da súmula não se aplica, como no caso de definir os requisitos que devem estar presentes para configurar ou não o grupo econômico. Com isso, disse, a análise da comprovação de existência do grupo permanece com os colegiados originários.
“Uma vez que o colegiado entenda pela configuração do grupo econômico, haverá o necessário reconhecimento da vigência do artigo 30, inciso 9, da Lei 8212/91, que, combinado com o artigo 124 do CTN, impõe a responsabilidade solidária das empresas que compõem o dito grupo”, explicou.
Já o conselheiro Leonam Medeiros foi contra a aprovação do texto por “falta de aclaramento”. Junto dele também ficaram vencidos os conselheiros Rodrigo Monteiro e Fernanda Melo Leal, que negaram a súmula por falta de amadurecimento da matéria. Neste caso, a aprovação se deu com placar final em 7×3.
Seis súmulas foram aprovadas pelo colegiado em votação unânime, incluindo enunciados sobre a contribuição previdenciária sobre o auxílio-alimentação pago em dinheiro e isenção da contribuição previdenciária sobre os valores repassados pelas operadoras de saúde a profissionais da área. Outras quatro foram aprovadas por maioria, o que indica algumas divergências de entendimento de cada conselheiro sobre as matérias.
3ª Turma da Câmara Superior
Duas súmulas foram aprovadas para o colegiado com o placar de 7×3. A primeira, que prevê a possibilidade de revisão aduaneira em qualquer canal de parametrização, já era aguardada. Isso porque está de acordo com precedentes recentes do STJ, embora eles não tenham sido decididos em sede de recurso repetitivo. Os conselheiros Tatiana Belisário, Oswaldo Gonçalves de Castro Neto e Denise Green foram vencidos.
O enunciado é considerado desfavorável aos contribuintes. O texto diz que “o desembaraço aduaneiro não é instituto homologatório do lançamento e a realização do procedimento de ‘revisão aduaneira’ não implica ‘mudança de critério jurídico’ vedada pelo art. 146 do CTN, qualquer que seja o canal de conferência aduaneira”.
Contra a proposta, o conselheiro Oswaldo Gonçalves de Castro Neto destacou que alguns precedentes apontados não trataram de revisão aduaneira, mas sim da análise do regime automotivo, via revisão aduaneira. Outro ponto levantado pelo conselheiro foi no sentido de ainda haver divergências sobre a matéria nos colegiados do Carf. “Quando vamos olhar nas turmas ordinárias, embora o tema seja mais pacificado do que anteriormente, ainda há muita divergência com votos que são dados por qualidade nesta matéria”, disse o conselheiro. Para ele, a súmula pode não trazer avanços, mas sim gerar novas controvérsias, ao invés de pacificar o tema.
“O contribuinte vai falar ‘olha não é possível fazer revisão aduaneira porque não foi demonstrado qual foi o erro que levou à possibilidade de fazer essa operação de critério’, e vai ser simplesmente levantada a súmula”, afirmou. O conselheiro disse ainda que tenderia a concordar com a súmula “se tivesse dito que somente o canal de parametrização não é empecilho à revisão aduaneira”.
A outra súmula aprovada trata da impossibilidade de tomada de créditos de PIS e Cofins sobre gastos com fretes relativos ao transporte de produtos acabados entre estabelecimentos da mesma empresa. O texto gera incômodo aos advogados representantes dos contribuintes, especialmente porque, ao sumular o tema, fica mais complicado fazer uma análise caso a caso, o que é considerado ideal em processos cuja matéria envolve insumos. Os especialistas apontam problemas ao desconsiderar situações específicas nas quais o frete poderia ser insumo.
A discussão dos insumos foi justamente o argumento exposto pelo conselheiro Oswaldo Castro Neto ao divergir da aprovação. Segundo ele, existe dificuldade em criar súmulas quando envolvem questões relacionadas aos insumos de PIS e Cofins. Segundo ele, por estarem vinculados ao processo produtivo do contribuinte, não é possível afirmar que o frete do produto acabado não será essencial ou relevante ao processo produtivo.
“Dou um exemplo: produção de ouro. O minério chega na indústria, na ponta final é transformado em lingote de ouro e, normalmente, a indústria de ouro fica afastada, por motivos evidentemente óbvios de controle do meio ambiente, de uma região mais segura, e esses lingotes de ouro precisam ser transportados para um local seguro, para um cofre forte. Esse frete de produto acabado entre estabelecimentos para essa empresa é relevante”, disse.
Esforço concentrado
Diferentemente de outros anos, a votação das súmulas não aconteceu em Brasília, mas na Superintendência da Receita Federal de Fortaleza (CE), onde os conselheiros estão reunidos para uma semana de eventos.
Essa foi a segunda rodada de votação de súmulas no ano, parte de um esforço da gestão de Carlos Higino Ribeiro de Alencar em dar celeridade e maior previsibilidade aos julgamentos. Em junho, após três anos de hiato, o conselho aprovou 14 súmulas, incluindo textos sobre insumos de PIS e Cofins e sobre a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) paga a diretores.
Leia abaixo os enunciados aprovados
Pleno:
1ª Turma da Câmara Superior:
2ª Turma da Câmara Superior:
3ª Turma da Câmara Superior:
FONTE: JOTA – POR FERNANDA VALENTE E DIANE BIKEL