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COMBATE À SONEGAÇÃO E REFORMA TRIBUTÁRIA

6 de setembro de 2024

Ao mesmo tempo em que a reforma tributária é uma oportunidade para aperfeiçoar o sistema fiscal brasileiro, também é o momento para se adotar uma estratégia interfederativa capaz de estimular uma maior conformidade tributária

Precisamos de um ambiente de negócios que inspire confiança, onde a honestidade seja a norma. Este talvez seja um momento histórico favorável para transformar essa visão em realidade. A reforma tributária (Emenda Constitucional nº 132/2023) tem predominado no debate político nacional. Embora não seja perfeita, tem potencial para melhorar o sistema tributário, promover justiça fiscal e fortalecer a economia do país.

O alcance desses objetivos, na amplitude que se almeja, exige necessariamente a formação de uma aliança sólida de combate à sonegação fiscal, permitindo tanto a responsabilização e a punição de autores de crimes tributários, especialmente nos casos de fraudes fiscais estruturadas, como a indispensável recuperação de ativos desviados do Estado – lembrando que os tributos constituem a principal fonte de custeio de despesas públicas, destacando-se as relacionadas às políticas públicas sociais.

Em última análise, é fundamental reconhecer que a recuperação de tributos sonegados garante o ingresso de recursos financeiros e é um meio eficaz para assegurar o financiamento de políticas e serviços públicos essenciais, como saúde, educação e segurança, em benefício da população.

A sonegação fiscal no Brasil há muito atinge valores elevadíssimos: estima-se que ultrapasse anualmente a marca de R$ 500 bilhões. Essa realidade extremamente negativa tem se agravado com a crescente prática de fraudes fiscais estruturadas, que envolvem planejamento e estratégias ilícitas sofisticadas, utilizadas para sonegação de tributos, lavagem de dinheiro e blindagem patrimonial, além da potencial prática de outros crimes em conjunto.

Ao sonegar e utilizar esquemas de lavagem de dinheiro, uma empresa pode oferecer preços abaixo dos preços da concorrência, reinvestir os recursos ilícitos e aumentar a distribuição de lucros entre os sócios. Isso gera uma vantagem competitiva desleal, contaminando o ambiente de negócios, distorcendo o mercado e criando barreiras ao empreendedorismo ético, podendo levar ao fechamento de empresas regulares, impedir a abertura de novas e causar sérios danos à sociedade.

Não bastasse isso, há ainda o potencial prejuízo aos investidores, quando se apresentam falsos resultados financeiros em relatórios na Bolsa de Valores. São informações relevantes que reverberam na avaliação do valor de mercado das ações e induzem o comportamento de investidores.

Os crimes tributários constituem-se em uma macrocriminalidade econômica silenciosa que ignora limites geográficos. O combate a essa delinquência do colarinho branco exige enfrentamento estratégico, planejado e coordenado por parte do Estado, que tem o Ministério Público brasileiro como personagem central, ao exercer de forma privativa a titularidade da ação penal pública, presidindo investigações e instaurando processos criminais.

Essa atuação do Ministério Público tem sido exercida no âmbito dos Comitês Interinstitucionais de Recuperação de Ativos (Ciras), presentes em boa parte das unidades federadas, com relevância em casos que exigem a atuação conjunta e cooperação por envolver os interesses de diferentes órgãos de Estado, como a sonegação fiscal. É uma forma de garantir economia de recursos e maximizar a eficiência e eficácia da atividade estatal.

Sensível a essa realidade e atento às mudanças promovidas pela reforma tributária aprovada pelo Congresso Nacional, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Justiça dos Estados e da União (CNPG), entidade que congrega os chefes de todos os Ministérios Públicos do país, criou em maio o Grupo Nacional de Defesa da Ordem Econômica e Tributária (GNDOET), com a finalidade de aprofundar estudos, realizar eventos, apresentar propostas e articular ações nacionais que fortaleçam a atuação no combate à macrocriminalidade econômica.

A primeira reunião ocorreu em junho, em Belo Horizonte, no ato de encerramento do Encontro Nacional dos Ciras, organizado pelo Comitê de Minas Gerais. A segunda reunião do grupo começou ontem, em São Paulo, durante o IV Encontro Nacional de Promotores de Justiça da Ordem Tributária, promovido pelo Ministério Público paulista.

Portanto, ao mesmo tempo em que a reforma tributária é uma oportunidade para aperfeiçoar o sistema fiscal brasileiro, com maior coordenação e colaboração entre os entes federados, também é o momento para se adotar uma estratégia interfederativa capaz de estimular uma maior conformidade tributária, especialmente no que diz respeito às grandes corporações. Nesse contexto, o Ministério Público aproveita o momento e incrementa com ênfase o combate aos crimes tributários estruturados, que causam inúmeros prejuízos à sociedade, à concorrência e aos investidores, articulando o engajamento e o nivelamento nacional na prevenção e repressão a esse quadro de ilicitude.

Francisco Zanicotti é procurador-geral do Ministério Público do Paraná e presidente do Grupo de Trabalho de Defesa da Ordem Econômica e Tributária (GNDOET) do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Justiça dos Estados e da União (CNPG)

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR FRANCISCO ZANICOTTI

 

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