Análise do caso deve terminar no Plenário Virtual até a próxima sexta-feira
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar uma questão importante e que poderá impactar a reforma tributária: a incidência do ITCMD sobre os planos de previdência privada VGBL e PGBL em caso de morte do titular. Especialistas preveem nova onda de judicialização se os ministros decidirem contra a tributação, entendimento adotado pelo relator, ministro Dias Toffoli, e acompanhado até agora pelos ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
Os votos estão em sentido contrário ao que, por ora, está previsto no Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108/2024, que regulamenta a Emenda Constitucional nº 132, aprovado na Câmara dos Deputados — estão pendentes apenas destaques. Ainda não há definição sobre quais serão as alíquotas do tributo (que hoje variam de 4% a 8%), mas já se sabe que haverá tributação progressiva, a depender do valor a ser transferido aos herdeiros.
Segundo advogados, qualquer que seja a decisão do STF neste julgamento, não derruba o texto do Congresso Nacional, mas sinaliza qual é o entendimento a ser adotado pelo Judiciário. Até que a nova lei entre em vigor, dizem, valerá a decisão do Supremo.
Após a nova legislação ser sancionada, ela é que deverá ser cumprida, sob pena dos contribuintes serem multados pelos Estados. A solução, portanto, de acordo com tributaristas, seria buscar proteção na Justiça, que já estaria com entendimento uniformizado pelos ministros.
“A lei nova [se estabelecer a tributação] certamente vai ser questionada no Judiciário e vai chegar no Supremo de novo. E, quando chegar, vai se aplicar o mesmo racional, porque a natureza jurídica da discussão é a mesma”, afirma o advogado Rodrigo Martone, sócio do Pinheiro Neto Advogados.
Na visão dele, ou cada contribuinte ingressará com um processo para afastar a incidência, ou uma entidade do setor entrará com ação no STF para afastar a eficácia do dispositivo aprovado.
Para Martone, a incidência não deve ser aplicada porque os valores enviados aos beneficiários não ocorrem de forma automática após a morte do titular. “Então não tem acréscimo de patrimônio no seu acervo.” Ele lembra ainda que esse ganho de capital posterior terá outra tributação, na declaração de Imposto de Renda.
O tema está em julgamento no Plenário Virtual do STF até sexta-feira, 30. Toffoli segue o parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR), contra a tributação dos planos. O argumento central é que o VGBL e o PGBL, na transmissão a herdeiros, “passam a cumprir finalidade acessória e a funcionar como verdadeiro seguro de pessoa/vida”.
Nesse caso, acrescenta o ministro, deveria ser aplicado o artigo 794 do Código Civil. O dispositivo estabelece que “no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”.
“Nessa toada, o ITCMD não incide sobre os direitos e os valores repassados aos beneficiários no caso de falecimento do titular do VGBL ou do PGBL”, diz ele, ao considerar inconstitucional dispositivos da Lei do Rio de Janeiro nº 7.174, de 2015 (RE 1363013).
Toffoli propõe a seguinte tese: “É inconstitucional a incidência do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD) sobre o repasse aos beneficiários de valores e direitos relativos ao plano vida gerador de benefício livre (VGBL) ou ao plano gerador de benefício livre (PGBL) na hipótese de morte do titular do plano”.
Na Câmara dos Deputados, porém, a tributação ainda pode cair por meio de emenda. Os destaques podem ser apreciados nesta semana. Um deles é do deputado Domingos Neto (PSD-CE), apoiado pelo bloco União-PP. A proposta pretende retirar a incidência do ITCMD sobre todos os planos de previdência complementar.
“Se o STF enquadrar o VGBL e o PGBL, na herança, como seguro, não daria para manter, na reforma, a tributação. Só se falar também que seguro está sujeito a ITCMD”, diz o advogado Eduardo Suessmann, sócio do SBP Law. “Se for mantido, o texto poderá ser questionado judicialmente, gerando novo contencioso.”
O tributarista Luiz Gustavo Bichara, sócio do Bichara Advogados, que defende a Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Previdência Complementar Aberta (Fenaseg) no processo, destaca que o voto do relator é claro no sentido de que “transmissão, nos termos da Constituição, não pode ser considerado algo além da herança, sendo certo que PGBL e VGBL não se sujeitam aos efeitos sucessórios”.
Ele também avalia que “a fundamentação do voto reafirma, também para o futuro, a impossibilidade da pretendida incidência”. “Esse ponto é especialmente relevante, na medida em que a reforma tributária pretende instituir essa inusitada cobrança. O voto é preciso e um enorme alívio ao mercado.”
Em nota, a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), que é parte interessada (amicus curiae) na ação, diz que a decisão impactará 11 milhões de famílias aderentes aos planos de seguro e previdenciários, “penalizando um comportamento de responsabilidade financeira que deveria ser incentivado”.
FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR ARTHUR ROSA E MARCELA VILLAR – SÃO PAULO