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O IBS E SUA COMPETÊNCIA COMPARTILHADA ADMINISTRATIVA E JUDICIAL

27 de maio de 2024

Deverá a União atuar em litisconsórcio com os estados, DF e municípios?

No final do mês de abril, o governo enviou para o Congresso o PLP 68/2024, que institui o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS), nos termos da Emenda Constitucional 132/2023, que trata da reforma tributária[1].

De acordo com a EC 132 e com o citado PLP 68, o chamado IVA Dual será composto pelo IBS e pela CBS, tributos plurifásicos que incidirão sobre todas as operações com bens e serviços realizados ao longo da cadeia até o consumidor final. Assim, pretende-se que a apuração destes tributos se dê de forma centralizada e o recolhimento destes seja feito em guia única. Inobstante isso, os referidos diplomas prevêem que a CBS deverá ser gerida pela União e, por seu turno, o IBS deverá ser gerido pelos estados, pelo DF e pelos municípios, de forma conjunta, através de um Comitê Gestor.

No tocante ao IBS e sua gestão compartilhada (que é o foco do nosso estudo), temos que este será um novo tributo que unificará e substituirá o ICMS e o ISS, sendo sua receita destinada aos estados, DF e municípios. Sendo assim, o PLP 68 prevê a criação de um Comitê para gestão conjunta do IBS.

O chamado Comitê Gestor terá um enorme poder, que será, dentre outros, de arrecadar, gerir e distribuir as receitas do IBS entre seus entes federados. A intenção do governo ao defender essa centralização é garantir a distribuição de recursos, pelo princípio do destino, de forma ágil, assim como a devolução dos créditos aos contribuintes, favorecendo uma maior eficiência tributária.

A criação desse Comitê está prevista no art. 156-B da CF (com alterações propostas pela EC 132), segundo o qual, este será considerado uma entidade publica sob regime especial, com independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira; prevendo, ainda, o seu § 2º, V, que este Comitê poderá definir hipóteses de delegação ou de compartilhamento de competências. Mas, além de extremamente genérico e confuso, o citado art. 156-B não conceitua o que seria compartilhamento de competência. Presumivelmente, aqui, o legislador pretendeu já deixar o caminho aberto para uma legitimação da União sobre o IBS.

Ora, sendo o IBS um imposto de âmbito nacional, regido por lei complementar (de aplicabilidade nacional), é um contrassenso defender a gestão por um Comitê Gestor composto por representantes dos entes federados, de forma independente da União. Em verdade, lendo os textos até então aprovados, parece-nos, que, assim como o CBS, o IBS deverá ficar também centralizado na União.

Nesta senda, prescreve o §6º do citado art. 156-B que: o Comitê Gestor, a administração tributária da União e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional compartilharão informações fiscais relacionadas ao IBS e ao CBS e atuarão com vistas a harmonizar normas, interpretações, obrigações acessórias e procedimentos a ele relativos; mais uma vez, em uma clara federalização do IBS.

Apesar desta previsão, vemos, no entanto, que tanto o PLP 68 como as demais propostas e projetos até então apresentadas sobre o tema, trazem algumas disposições sobre uma possível competência compartilhada financeira, mas praticamente nada quanto à competência processual, que aparentemente será muito mais desafiadora.

O governo informou, quando da apresentação do PLP 68, que deverá apresentar, em breve, um projeto de lei complementar referente às atribuições do Comitê Gestor do IBS e quanto às possíveis competências a serem compartilhadas. Assim sendo, esperamos que a partir desse projeto possamos contar com disposições que nos tragam mais clareza, especialmente no que tange à competência processual administrativa e judicial deste novo imposto.

É oportuno dizer, que, a frente parlamentar, através do Congresso Nacional, apresentou o PLP 39/24, com vistas a regulamentar a forma como se dará a competência deste Comitê, porém apenas na esfera administrativa.

Portanto, a gestão do IBS pelo referido Comitê é algo ainda muito nebuloso. Afinal, de que forma se dará essa gestão e quem terá legitimidade para tanto? Isso ainda não está claro. Será a competência do contencioso administrativo e judicial do IBS da Procuradoria do Estado ou do Município do contribuinte? De origem ou de destino? Ou será da União?

Não bastasse isso, ainda parece-nos ilógico que o mesmo Comitê que terá o poder de regulamentar, gerir e arrecadar tenha, também, o poder de decidir o contencioso administrativo!

O referido PLP também prevê a possibilidade de celebração de convênio entre a RFB e as administrações tributárias dos Estados, DF e Municípios para delegação recíproca da atividade de fiscalização do IBS e da CBS, mas tal previsão seria apenas para os processos fiscais de pequeno valor. Ainda, prevê que o Ministério da Fazenda e o Comitê Gestor do IBS poderão celebrar convênio para delegação recíproca de competência para o julgamento do contencioso administrativo relativo ao lançamento de ofício do IBS e da CBS.

Notadamente, nós não podemos ter múltiplas fiscalizações do IBS. Para obtermos a simplicidade desejada precisamos de uma gestão de fato una, sendo de rigor que a legislação preveja com mais clareza a quem caberá essa fiscalização, e, da mesma forma quanto à legitimidade ativa e passiva no âmbito administrativo e judicial nos litígios que envolvam o IBS.

O que se busca no Brasil com o IVA é justamente uma legislação tributária mais harmônica, transparente e simplificada, visando reduzir as desigualdades, a inadimplência tributária e a guerra fiscal, favorecendo investimentos estrangeiros. Mas, até agora, o proposto IVA Dual, e especialmente o IBS, tem se mostrado complexo e de difícil operacionalização.

Especialmente no início, inúmeras dúvidas e conflitos surgirão, sendo imprescindível que se tenha com clareza de quem é a legitimidade para representação administrativa e judicial das demandas exacionais e antiexacionais do IBS.

Atualmente, vemos que nem o PLP 68/24 (apresentado pelo governo) e nem o PLP 39/24 (da frente parlamentar), resolvem esse problema. Ao contrário, ao preverem uma gestão compartilhada, estes projetos de lei acabam trazendo ainda mais dúvidas, pois, de que forma essa competência judicial poderá ser compartilhada? Deverá a União atuar em litisconsórcio com os estados, DF e municípios? Se assim ocorrer, de quem será a competência para julgar a matéria? Da Justiça Federal ou da Justiça Estadual?

Deste modo, esperamos que o projeto de lei complementar do governo que está por vir traga respostas a estas indagações, em especial quanto à atuação do Comitê Gestor e sua legitimidade e representatividade em face do IBS, o que se mostra determinante para o êxito da reforma tributária.

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[1] Conforme publicado no Diário Oficial do dia 24.04.24, através da Mensagem N. 156 – https://www.in.gov.br/web/dou/-/despacho-do-presidente-da-republica-555961487logo-jota

FONTE: JOTA – POR CRISTIANE CAMPOS MORATA

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