Temor é que regra única nacional leve a desequilíbrio nas contas de alguns governos regionais.
Os Estados querem autonomia para decidir o tamanho do cashback que pagarão aos contribuintes quando esse mecanismo entrar em vigor, como parte da reforma tributária sobre o consumo.
Se for estabelecido um desenho único para todo o país, algumas unidades da Federação poderão enfrentar desequilíbrio fiscal, disse ao Valor o presidente do Comitê de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), Carlos Eduardo Xavier, secretário de Fazenda do Rio Grande do Norte.
A reforma tributária, cuja proposta de regulamentação foi apresentada na semana passada ao Congresso Nacional, prevê que famílias de baixa renda receberão de volta parte dos tributos pagos sobre alimentos, água, energia e gás. No entanto, os Estados querem fazer essa política pública conforme o tamanho de seus bolsos, explicou.
O Comsefaz divulgou nota listando nove pontos em que não há acordo com o governo federal, em relação ao projeto apresentado na semana passada.
Além disso, o projeto de lei que regulará o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) não foi encaminhado ao Legislativo no cronograma original por falta de acordo entre União e Estados. O plano era apesentar os dois projetos simultaneamente.
A falta de acordo ocorre, nas duas propostas, porque os Estados veem risco de perda de autonomia federativa. O cashback é um exemplo.
Outro é a possibilidade de manter os fundos de combate à pobreza, que os Estados hoje financiam com um adicional de 2% no Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). É um tema importante para Estados do Norte e Nordeste, ressaltou o presidente do Comsefaz.
Há discordância também em relação ao Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, criado para ressarcir as empresas que perderão os incentivos fiscais estaduais com a reforma.
O Ministério da Fazenda propõe apoiar apenas aqueles benefícios concedidos sob condição onerosa, ou seja, que envolvem algum tipo de contrapartida pela empresa. Os Estados defendem um conceito mais amplo, incluindo todos os benefícios convalidados pela Lei Complementar 160.
Tampouco foi possível alcançar um acordo em relação ao pleito dos Estados de manter o sistema de substituição tributária, hoje responsável por 38% da arrecadação do ICMS. A Fazenda considera o modelo inadequado ao novo sistema.
Há discordância também em relação ao período em que será medida a arrecadação do ICMS para definir a distribuição das receitas do IBS, criado pela reforma. Os Estados defendem que seja de 2020 a 2027. A Fazenda defendia um intervalo menor, de quatro anos. Sem acordo, o projeto de lei não especifica datas.
É preciso cautela para que questões corporativas não contaminem o novo sistema tributário — Carlos Eduardo Xavier.
Outros pontos de discordância envolvem a tributação de compras governamentais, a diferenciação entre crédito acumulado e saldo credor do IBS, a prestação de informações pelas instituições financeiras ao Comitê Gestor e ajustes no Simples Nacional, para que a tributação fique no destino.
Xavier não detalhou as divergências a respeito do projeto de lei que regulará o Comitê Gestor. Mas, também nesse caso, há preocupação com a autonomia dos Estados e municípios nas funções de arrecadar e fiscalizar os novos tributos, além de decidir políticas públicas. Governadores deverão entrar em campo para assegurar esse princípio.
Segundo o presidente do Comsefaz, é preciso cautela para que questões corporativas não contaminem a montagem do novo sistema tributário.
Em relação ao projeto de lei que já foi encaminhado ao Congresso, a estratégia dos Estados é negociar alterações com deputados e senadores. O projeto que está em elaboração ainda será objeto de negociações ao longo desta semana.
As divergências não são grandes nem incontornáveis ao ponto de ameaçar a implementação do novo sistema, assegurou o secretário. Ele afirmou que os Estados defendem a premissa da simplificação trazida pela reforma tributária.
O secretário ainda elogiou o fato de o governo federal haver aberto ao diálogo com Estados e municípios para elaborar a proposta de regulamentação da reforma tributária. O diálogo vem sendo feito desde janeiro e, no processo, houve muita convergência, ressaltou.
O secretário especial de Reforma Tributária, Bernard Appy, também tem dito que a elaboração da proposta de regulamentação da reforma tributária foi feita “a seis mãos”, em colaboração com Estados e municípios.
O Valor questionou o Ministério da Fazenda sobre esses pontos, mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.
FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR LU AIKO OTTA — DE BRASÍLIA