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MATERIAIS PASSÍVEIS DE DEDUÇÃO DA BASE DO ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL

13 de maio de 2025

Este artigo se propõe a tratar do marco temporal para aplicação da interpretação jurisprudencial mais restritiva aos materiais passíveis de dedução da base de cálculo do ISS nos serviços de construção civil consolidada no julgamento do REsp nº 1.916.376/RS com trânsito em julgado em 12/5/2023. Para tanto, faz-se necessária uma retrospectiva da jurisprudência que trata do assunto. A posição histórica do Superior Tribunal de Justiça sempre foi no sentido de sustentar uma interpretação restritiva ao conceito de materiais passíveis de dedução nas hipóteses de construção civil.

Em fevereiro de 2010, o Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral ao RE 603.497. Após, em agosto daquele ano, a relatora, ministra Ellen Grace, proferiu decisão monocrática para dar provimento ao recurso extraordinário ajuizado pela empresa de construção e restabelecer a sentença, atendendo a pretensão do contribuinte. A partir dessa decisão, criou-se o entendimento de que o STF defendia a interpretação mais abrangente a possibilitar as deduções de materiais de maneira ampla da base de cálculo do ISS na construção civil.

Em agravo interno do RE 603.497, o Tribunal Pleno do STF, agora com relatoria da ministra Rosa Weber, reafirma a recepção do artigo 9º, §2º do DL nº 406/68 e a possibilidade de dedução. Contudo, determina que a interpretação sobre o alcance da norma e da legislação que lhe sucedeu em especial a Lei Complementar nº 116/2003 é de competência do Superior Tribunal de Justiça.

Com esse entendimento, há o retorno da jurisprudência antiga pelo STJ, firmada no julgamento do Resp. 1.916.376/RS com trânsito em julgado em 12.mai.2023, cuja ementa transcreve-se:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ACÓRDÃO COMBATIDO. DECISÃO SURPRESA. INEXISTÊNCIA. ISS. BASE DE CÁLCULO. SERVIÇO DE CONCRETAGEM. DEDUÇÃO DOS MATERIAS EMPREGADOS. IMPOSSIBILIDADE.

  1. A valoração jurídica diversa, calcada nos fatos da causa, dada pelo magistrado à atividade empresarial da contribuinte não caracteriza decisão surpresa que justifique a anulação do julgado.
  2. Esta Corte Superior há muito consolidou o entendimento de que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço de construção civil contratado, não sendo possível deduzir os materiais empregados, salvo se produzidos pelo prestador fora do local da obra e por ele destacadamente comercializados com a incidência do ICMS. Precedentes.
  3. O Supremo Tribunal Federal, ao proferir o primeiro julgamento do RE 603.497/MG (Tema 247 do STF), em 31/08/2010 (DJ 16/09/2010), decidiu reformar acórdão do STJ com fundamento no entendimento do Pretório Excelso sobre a “possibilidade de dedução da base de cálculo do ISS dos materiais empregados na construção civil”.
  4. A partir desse momento, esta Corte Superior, buscando alinhar a sua jurisprudência à referida decisão da Suprema Corte, começou a decidir naquele mesmo sentido, como se observa, a título de exemplo, no AgRg nos EAREsp n. 113.482/SC, relatora Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção, julgado em 27/2/2013, DJe de 12/3/2013.
  5. Entretanto, mais recentemente, em 03/07/2020 (publicação da ata de julgamento em 13/07/2020), nos mesmos autos do RE 603.497/MG, o STF deu parcial provimento a agravo interno para, reafirmando a tese de recepção do art. 9º, § 2º, do DL n. 406/1968 pela Constituição de 1988, assentar que a aplicação dessa tese naquele caso concreto não ensejou reforma do acórdão do STJ, ficando evidenciada, no referido julgamento, a intenção do Pretório Excelso de preservar a orientação jurisprudencial que o Superior Tribunal de Justiça sedimentou no âmbito infraconstitucional acerca da impossibilidade de dedução dos materiais empregados da base de cálculo do ISS incidente sobre serviço de construção civil.
  6. Diante desse último pronunciamento da Suprema Corte no julgamento do seu Tema 247, há de voltar a ser prestigiada a vetusta jurisprudência do STJ sobre o tema.
  7. Hipótese em que a parte autora nem sequer alegou, muito menos comprovou, que comercializou de forma apartada os materiais empregados nos serviços de concretagem e submeteu o valor deles à tributação pelo ICMS, de modo que não faz jus à pretendida dedução da base de cálculo de ISS.
  8. Recurso especial desprovido.” (REsp n. 1.916.376/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 14/3/2023, DJe de 18/4/2023.) – grifo nosso.

Pois bem. Descrita essa retrospectiva, consagram-se o marco constitucional e o marco infraconstitucional para interpretação da palavra “materiais” que são passíveis de serem deduzidos da base de cálculo do ISS sobre serviços de construção civil.

No município de Porto Alegre, como em tantos outros, o Fisco se valeu para análise das deduções da base de cálculo da suposta jurisprudência do STF que vigorou de 2010 a 2023, e que somente foi esclarecida com o julgamento do Agravo Interno no RE 603.497, em 2020, e do RESP 1.916.376/RS, em 2023.

Desse modo, estipular como marco inicial o trânsito em julgado do Resp 1.916.376/RS, para possibilitar a tributação do ISS na construção civil com as deduções legalmente permitidas da respectiva base de cálculo, utilizando a interpretação mais restritiva, respeita aos princípios da confiança e da boa-fé, bem como ao disposto no artigo 146 do CTN, que assim prevê:

Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em consequência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.”

Isso pois, ainda que se sustente que não houve alteração na legislação aplicável, e de fato não houve, certo é que há uma diferenciação na interpretação jurisprudencial dada e reconhecida pelo próprio STJ, que expressamente afirma no REsp 1.916.376/RS:

“4. A partir desse momento, esta Corte Superior, buscando alinhar a sua jurisprudência à referida decisão da Suprema Corte, começou a decidir naquele mesmo sentido, como se observa, a título de exemplo, no AgRg nos EAREsp n. 113.482/SC, relatora Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª Região), 1ª Seção, julgado em 27/2/2013, DJe de 12/3/2013.”

No mesmo sentido, agiu o Fisco municipal porto-alegrense, dando interpretação mais abrangente ao conceito de materiais passíveis de dedução da base de cálculo do ISS, enquanto vigente essa interpretação. O que valida a aplicação do artigo 146 do CTN, tendo em vista que a modificação na maneira de tributar se deu em consequência de decisão judicial sobre os critérios jurídicos adotados, devendo ser aplicada para fatos geradores ocorridos posteriormente à sua introdução.

Por outro lado, não há falar em necessidade de alteração legislativa para fins de aplicação da interpretação mais restritiva ao conceito de materiais. A possibilidade de dedução de materiais está tanto na legislação nacional quanto na municipal, no que diz respeito à base de cálculo de serviços de construção civil. Houve apenas uma alteração na interpretação jurisprudencial dada à norma legal já existente.

Dois marcos temporais

Diferente é a hipótese de legislação municipal prevendo opção por deduções presumíveis, como era o caso de Porto Alegre, que, desde 2007, previa a possibilidade de opção pela receita presumida, em que o contribuinte ao optar por esta, deduzia diretamente da receita bruta o valor estimado dos materiais aplicados aos serviços, até o percentual de 60% nos casos de edificações residenciais, comerciais e mistas.

Nesse caso, em relação a essa opção, houve alteração legislativa, pois a Lei Complementar Municipal nº 998/2023 revogou essa opção, não permitindo mais a possibilidade de deduções presumidas. Referida lei, conforme expressamente previsto em seu artigo 3º, passou a ter efeitos a partir de 1º de junho de 2024.

Dessa forma, para o tema da dedução de materiais empregados nos serviços de construção civil, seguindo a interpretação mais restritiva, que somente permite a dedução de materiais produzidos pelo prestador fora do local da obra e com destaque e incidência de ICMS, temos dois marcos temporais:

1º) para os contribuintes de regimes de deduções presumidas, como o caso do município de Porto Alegre (RS), que optaram por esses regimes, deve se assegurar o direito à opção, até que venha lei revogadora. No caso da capital gaúcha, a partir de 1º de junho de 2024, quando revogada referida opção pela LCM nº 998/23;

2º) para os demais contribuintes, não optantes da receita presumida, a interpretação restritiva deve ser aplicada após o trânsito em julgado do REsp nº 1.916.376/RS, pois quanto a estes não houve alteração legislativa, mas modificação de interpretação por decisão judicial, em respeito aos princípios da confiança e da boa-fé, bem como ao disposto no artigo 146 do CTN.

FONTE: CONSULTOR JURÍDICO – POR ANA CATARINA DANTAS FONTES DA CUNHA LEXAU

 

 

 

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