Telefone: (11) 3578-8624

FAZENDA PAULISTA NOTIFICA EMPRESAS QUE EXCLUÍRAM TARIFAS DE ENERGIA DO ICMS

8 de maio de 2025

Contribuintes que reduziram a base de cálculo do imposto estadual poderão se autorregularizar, com isenção de multa punitiva

A Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) notificou 300 contribuintes para quitarem dívidas relativas à exclusão indevida das tarifas de transmissão e distribuição de energia elétrica (Tust e Tusd) da base de cálculo do ICMS. A expectativa do Estado é regularizar R$ 700 milhões com o programa. As notificações começaram a ser enviadas em abril.

O Estado leva em consideração julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) contrário aos contribuintes. No ano passado, a 1ª Seção, em recursos repetitivos, validou a inclusão das tarifas na base de cálculo do tributo estadual. O entendimento evitou um rombo anual de R$ 33,7 bilhões aos Estados.

O tema, porém, ainda está em aberto. Foi apresentado recurso dos contribuintes ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde também tramita uma ação direta de inconstitucionalidade para reverter a atual cobrança (RE 1539198 e ADI 7195). O recurso está inclusive na pauta de julgamento do Plenário Virtual que se inicia no dia 16.

Por isso, advogados desaconselham a adesão ao programa da Sefaz-SP, pois requer a confissão da dívida e renúncia da discussão na Justiça, onde ainda há esperança de reversão, pois as ações ainda não transitaram em julgado (ainda cabem recursos).

A medida da Fazenda paulista vale para os contribuintes que não conseguiram decisões favoráveis determinando a exclusão das tarifas da base de cálculo do ICMS até 27 de março de 2017 – marco temporal fixado pelo STJ para a modulação (restrição) dos efeitos da decisão do ano passado (Tema 986). Aqueles que obtiveram decisão a favor antes podem se beneficiar da não tributação até maio de 2024, quando foi publicado o acórdão da Corte Superior sobre o tema.

A Sefaz-SP inclusive cita que a decisão do STJ foi o que motivou o lançamento do programa. Quem não aderir em 60 dias, a partir da data da notificação, pode sofrer autuação e responder a um processo administrativo. O pagamento da dívida pode ser à vista, parcelada e com uso de crédito acumulado de ICMS, inclusive de terceiros – uma novidade em relação às iniciativas anteriores. Não será cobrada multa punitiva, mas serão mantidos os juros e a multa moratória.

Segundo a secretaria afirmou ao Valor, o parcelamento pode ser feito em até 60 vezes, conforme consta na Resolução Conjunta SFP/PGE nº 02/2021. A autorregularização, informou o órgão, faz parte do Programa “Nos Conformes”, amparada na Lei Complementar nº 1.320/2018. Ele visa “aprimorar a relação entre o Fisco e os contribuintes, promovendo maior previsibilidade e segurança jurídica no cumprimento das obrigações fiscais”.

Não foi publicada uma norma com mais detalhes dos benefícios da adesão. “As pessoas abrangidas pelo programa receberão orientação por meio do Domicílio Eletrônico (DEC) ou via postal, com as informações necessárias à autorregularização”, disse a Sefaz-SP.

A discussão começou por uma divergência de interpretação sobre a base do ICMS na tributação de energia elétrica prevista na Lei Kandir, a Lei Complementar nº 87/1996. Enquanto os contribuintes defendem que deve ser só o valor da energia consumida, o Fisco entende que é o valor da operação, incluindo a tarifas de transmissão e distribuição.

De acordo com a tributarista Marina Pires Bernardes, a jurisprudência era favorável aos consumidores no STJ até 2017, quando houve a primeira decisão desfavorável (REsp 1163020). Anos depois, a questão foi julgada por meio de recursos repetitivos, reafirmando o entendimento contrário aos contribuintes.

Mas o julgamento do ano passado não encerra a controvérsia, diz a advogada. “A adesão ao programa de autorregularização exige do contribuinte a renúncia a uma discussão viva, complexa e juridicamente relevante, ainda sem resposta definitiva do Judiciário e que pode ser objeto de modulação de efeitos pelo STF, impedindo a restituição do valor pago anteriormente ao julgamento”, afirma.

Marina lembra que paralelamente à discussão judicial, a Lei Complementar nº 194/2022 passou a fazer parte do ordenamento jurídico, apesar de uma liminar do ministro Luiz Fux, do STF, ter suspendido seus efeitos. Ela alterou a Lei Kandir para prever a não incidência das tarifas no ICMS. “A lei ainda existe e a constitucionalidade ainda vai ser analisada pelo plenário do Supremo.”

Cerca de dez clientes dela receberam notificações da Sefaz-SP, mas ela não recomenda a adesão ao programa. “Para quem entrou com ações a partir da lei complementar, não recomendaríamos ingressar no programa, porque 2022 para frente ainda está em litígio e quem entrou antes de 2022 ainda tem a possibilidade de admissão do recurso extraordinário no STF”, diz.

O tributarista Igor Mauler Santiago, afirma que hoje os contribuintes estão em situação desfavorável, por conta da decisão do STJ e da liminar no STF. “Mas a questão será analisada com a devida profundidade no julgamento de mérito”, diz.

Aderir ou não ao programa da Sefaz-SP é, portanto, acrescenta, uma “decisão empresarial”. “Tem muito mais a ver com cálculos financeiros, sobre os custos e benefícios, do que previsões jurídicas. Mas juridicamente ainda há uma possibilidade real de êxito dos contribuintes nessa matéria.”

Mauler Santiago lembra que a tese dos consumidores é “absolutamente sólida” e que o próprio Supremo já indicou que o tema seria infraconstitucional. “Portanto, o legislador tinha liberdade para defini-la, já que não havia na Constituição nenhuma indicação sobre incidência ou não do ICMS sobre a Tust ou Tusd.”

Ao Valor, a Sefaz-SP esclareceu que os R$ 700 milhões passíveis de regularização não necessariamente entrariam no caixa do governo, pois “haverá débitos que serão liquidados compensando-se com saldo credor, outros, com crédito acumulado de ICMS próprio ou de terceiros”. Há também, disse, os contribuintes que têm direito ao crédito do imposto pelo uso da energia como insumo em processo de industrialização.

Questionada sobre o motivo de abrir o programa com o tema ainda em discussão, a Sefaz-SP afirmou que ele “está sendo conduzido em estrita consonância com a legislação e a orientação dos órgãos jurídicos em relação ao cumprimento das decisões judiciais pertinentes”.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR MARCELA VILLAR – DE SÃO PAULO

 

 

Receba nossas newsletters