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MINISTROS DO SUPREMO VÃO DEFINIR CASO A CASO LIMITES PARA AÇÕES RESCISÓRIAS

24 de abril de 2025

Decisão frustra tentativa dos contribuintes de derrubar processos sobre “tese do século.

O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu ontem que os ministros decidirão, em cada caso, se cabe o ajuizamento das chamadas ações rescisórias – usadas para anular uma decisão judicial final após entendimento da Corte em sentido contrário. Se couber, de acordo com a tese firmada, o processo pode ser apresentado em até dois anos do trânsito em julgado de acórdão do STF, com efeitos que poderão retroagir por até cinco anos.

A decisão é um balde de água fria nos contribuintes que tentavam derrubar as ações rescisórias ajuizadas pela Fazenda Nacional para reduzir o impacto da derrota sofrida na “tese do século”. Elas foram direcionadas a empresas que entraram com processo após março de 2017 – quando o STF já havia decidido o mérito – e obtiveram decisão definitiva da Justiça, garantindo o direito a crédito, antes do julgamento dos embargos de declaração, em maio de 2021.

Existe discussão porque em 2021 os ministros aplicaram a chamada modulação de efeitos à decisão de mérito. Eles usaram como data-base o julgamento de mérito: de 15 de março de 2017 para frente, nenhum contribuinte precisaria mais recolher PIS e Cofins com o ICMS embutido na conta.

Mas foram criadas situações diferentes em relação à recuperação dos valores pagos no passado. Aqueles que tinham ações antes de 15 de março de 2017 têm o direito à restituição integral, ou seja, a contabilização dos créditos retroage até cinco anos antes do ajuizamento da ação. A regra muda, no entanto, para quem ajuizou processo depois. A recuperação do passado ficou limitada.

No julgamento de ontem, os ministros validaram previsões do Código de Processo Civil (CPC) sobre o início do prazo para propor ação rescisória: a data do trânsito em julgado da decisão do STF – que pode ser muito depois da data do julgamento. E decidiram que o entendimento adotado só vale daqui para frente, não afetando casos passados, como a “tese do século”.

A questão foi definida no novo formato de julgamentos do Supremo, em que as discussões são feitas fora da sessão. Ontem, o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, apenas leu a tese aprovada pela maioria, finalizando a discussão em poucos minutos (AR 2876, ADPF 615 E RE 586068).

Os ministros decidiram sobre a contagem do prazo para o ajuizamento de ações rescisórias que tenham como base uma decisão tomada pelo próprio STF. Se os dois anos previstos valem da decisão final no caso concreto ou do trânsito em julgado de acórdão do Supremo.

No caso concreto, a decisão que se pretendia alterar transitou em julgado em 25 de setembro de 2018 e a rescisória foi proposta em julho de 2021. Mas a decisão do STF sobre o assunto foi dada em 16 de outubro de 2019, com trânsito em julgado em novembro de 2022.

“Garante-se maior previsibilidade e estabilidade nas relações jurídicas” — Maiara H. Pires

Na sessão, os ministros fixaram que a previsão do CPC que estabelece a contagem a partir do trânsito em julgado de decisão do STF (parágrafo 15 do artigo 525 e o 8º do artigo 535) deve ser interpretada conforme a Constituição, com efeitos prospectivos. E declararam inconstitucional a determinação do Código de que a data desse julgamento do Supremo precisa ser anterior à da decisão de mérito que se quer reformar (parágrafo 14 do artigo 525 e 7º do artigo 535).

Em cada caso, segundo os ministros, o Supremo poderá definir os efeitos temporais de seus precedentes vinculantes e sua repercussão sobre a coisa julgada, estabelecendo, inclusive, o prazo que a rescisória poderá retroagir e, até mesmo, seu não cabimento diante do grave risco de lesão à segurança jurídica ou interesse social.

Se não houver manifestação expressa, os efeitos retroativos de eventual rescisão não passam de cinco anos da data do ajuizamento da rescisória, que deve ser proposta no prazo de dois anos a partir do trânsito em julgado pelo STF. Além disso, ficou definido que, em determinados casos, não será necessário entrar com ação, se for possível apresentar o pedido de anulação na fase de execução.

Ao anunciar o resultado, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a preocupação do Supremo era evitar que um caso que leva 10, 15 ou 20 anos fosse levado aos ministros com uma retroação que pudesse ter um impacto deletério.

Para Paulo Mendes, advogado-geral da União adjunto e professor do IDP, o ponto de maior novidade é a inexigibilidade do título executivo inconstitucional. “Não é mais necessário o ajuizamento de ação rescisória quando o precedente do STF for posterior à coisa julgada, se possível a alegação na fase de cumprimento de sentença”, diz.

Havia expectativa de como esse julgamento impactaria na “tese do século”. Cerca de 1.100 processos foram ajuizados pela PGFN contra as empresas. Segundo o órgão, 78% das ações movidas pelos contribuintes foram após o julgamento de mérito. Tanto o STF quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já tinham considerado válidas as anulatórias movidas pela União (RE 1489562 e REsp 2066696 e REsp 2054759).

Segundo Karen Alves, a decisão privilegia a segurança jurídica ao impedir que, na prática, seja permitida que uma decisão transitada em julgado e, portanto, estabilizada, possa ser revista a qualquer tempo por meio de ação rescisória, caso o STF venha a declarar a inconstitucionalidade da norma que fundamentou a decisão original.

A advogada Maiara Henriques Pires, vê a decisão da mesma forma. Para ela, a delimitação de prazo evita a reabertura de controvérsias já estabilizadas e impede que uma das partes invoque, em seu benefício, nova interpretação da Corte. “Garante-se maior previsibilidade e estabilidade nas relações jurídicas e no sistema judicial como um todo”, afirma.

Já Túlio Parente Miranda, entende que, quando o STF acolhe uma tese, mas opta por aplicá-la apenas para frente, sem ressalvar expressamente quem já a defendia em juízo, acaba afetando a previsibilidade para os jurisdicionados e comprometendo a confiança no sistema. “Milhares de contribuintes estão nessa exata condição: rescisórias já ajuizadas, com base nos dispositivos do CPC que agora foram interpretados pelo STF, mas sem uma resposta clara sobre a aplicação da nova regra a esses casos”, diz ele, em referência às anulatórias da “tese do século”.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR BEATRIZ OLIVON — DE BRASÍLIA

 

 

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