A ampliação dos benefícios fiscais declarados na Dirbi representa um avanço na busca por maior transparência tributária, mas também evidencia desafios econômicos, jurídicos e administrativos que precisam ser enfrentados .
A ampliação dos benefícios fiscais que devem ser informados na Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de Natureza Tributária (Dirbi), regulamentada pela Instrução Normativa nº 2.241 da Receita Federal, marcou um avanço significativo na transparência tributária no Brasil. Com a inclusão de 45 novos benefícios, o total de incentivos obrigatórios na declaração passou para 88, refletindo a complexidade do sistema tributário brasileiro e o peso das renúncias fiscais na economia. Essa medida não está isenta de críticas e levanta questões cruciais sobre os impactos econômicos e jurídicos associados à política de incentivos fiscais.
Entre os benefícios recém-incluídos, destacam-se as reduções de alíquotas do Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) a 0% para itens básicos do setor alimentício, como arroz, feijão, leite e carnes, e novos incentivos para a Zona Franca de Manaus, que abrangem isenções do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e alíquotas diferenciadas para a importação de máquinas e equipamentos. Essas mudanças visam estimular setores estratégicos da economia, como a produção alimentícia e o desenvolvimento industrial regional, enquanto buscam aliviar a carga tributária sobre produtos essenciais ao consumidor. Contudo, os custos fiscais dessas renúncias chamam atenção. Em 2024, a Receita Federal estimou que as renúncias fiscais declaradas somaram R$ 110,9 bilhões, em um cenário onde o déficit primário ultrapassa R$ 141 bilhões.
Economicamente, a redução de tributos sobre alimentos básicos pode contribuir para o controle inflacionário, já que esse grupo de produtos representa cerca de 20% do IPCA. Essa medida, em períodos de pressão inflacionária, alivia o custo de vida das famílias, sobretudo as de baixa renda, promovendo um impacto social relevante. No entanto, as desonerações tributárias, apesar dos benefícios imediatos, devem ser avaliadas sob uma perspectiva de eficiência econômica e retorno social. Os recursos públicos renunciados poderiam ser investidos em áreas como saúde, educação e infraestrutura, setores que carecem de investimentos robustos para atender às demandas sociais.
Já os incentivos voltados à Zona Franca de Manaus reforçam o caráter estratégico da região como polo de desenvolvimento regional e preservação ambiental. Porém, estudos realizados pelo Ipea sugerem que o custo fiscal por emprego gerado na Zona Franca é alto, o que levanta dúvidas sobre a eficácia dessas medidas a longo prazo. Esses incentivos, embora contribuam para a competitividade local, geram distorções no pacto federativo, uma vez que outras regiões do país não usufruem dos mesmos benefícios tributários. Essa disparidade põe em discussão a isonomia tributária, um princípio constitucional que deveria nortear a política fiscal brasileira.
Juridicamente, a obrigatoriedade de declarar os novos incentivos de forma retroativa, com início em janeiro de 2024 e prazo final em março deste ano, levanta preocupações quanto à segurança jurídica e ao ônus administrativo imposto aos contribuintes. Pequenas e médias empresas, que carecem de estrutura administrativa robusta, podem enfrentar dificuldades para se adequar às novas exigências. Essa situação revela a necessidade de simplificação do sistema tributário e de maior diálogo entre o governo e os contribuintes, especialmente os de porte, para garantir o cumprimento das obrigações acessórias sem comprometer a competitividade empresarial.
A análise dos benefícios fiscais também destaca sua concentração em setores específicos, como adubos, fertilizantes, defensivos agrícolas e desoneração da folha de pagamentos. Embora esses incentivos tenham justificativas econômicas e sociais, é imprescindível avaliar se eles estão, de fato, gerando os retornos esperados. O impacto econômico das renúncias fiscais deve ser monitorado, utilizando indicadores objetivos que permitam mensurar sua eficiência e identificar potenciais ajustes. A transparência proporcionada pela Dirbi é um passo importante nessa direção, mas precisa ser acompanhada por mecanismos efetivos de controle e avaliação.
A multiplicidade de regimes tributários e benefícios fiscais no Brasil também expõe as fragilidades do sistema tributário nacional. As complexidades do modelo atual dificultam o cumprimento das obrigações por parte dos contribuintes e aumentam os custos de conformidade, especialmente para empresas de menor porte. Para mitigar esses impactos, é necessário investir em simplificação tributária, modernização dos processos administrativos e ampliação dos canais de suporte ao contribuinte.
Em síntese, a ampliação dos benefícios fiscais declarados na Dirbi representa um avanço na busca por maior transparência tributária, mas também evidencia desafios econômicos, jurídicos e administrativos que precisam ser enfrentados. Além disso, a transparência deve ser acompanhada de uma revisão mais ampla do sistema tributário, promovendo maior equidade, eficiência e sustentabilidade fiscal. Somente por meio de uma gestão criteriosa e transparente dos recursos públicos será possível construir um sistema tributário mais justo e alinhado às necessidades de um Brasil que busca crescimento econômico sustentável e inclusão social.
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FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR LEONARDO ROESLER