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NÚMERO DE PEDIDOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS DISPARA EM 2023

5 de fevereiro de 2024

É o quarto índice mais alto registrado pela Serasa Experian desde o ano de 2005.

O número de recuperações judiciais no país não para de crescer. O ano de 2023 terminou com 4.045 empresas efetivamente em processo de reestruturação, índice considerado alto por especialistas, e um recorde no volume de pedidos. Foram registrados 1.405 ao longo do ano, um aumento de quase 70% em relação a 2022.

É o quarto índice mais alto de pedidos registrado pela Serasa Experian desde o início da série histórica, em 2005, e o maior volume desde 2020 – mesmo patamar alcançado nos anos de 2012, 2018 e 2019. Micro e pequenas empresas lideraram a procura (939 delas). E um total de 135 grandes companhias recorreram ao Judiciário.

“Foi um surpreendente aumento no índice de recuperações judiciais no Brasil, consequência do crescimento da inadimplência, que bateu recorde histórico no ano passado”, diz o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, destacando que, em outubro (último dado disponível sobre inadimplência), eram 6,6 milhões de empresas no vermelho. As dívidas somavam R$ 125,8 bilhões.

Hoje, duas a cada mil empresas em atividade estão em recuperação judicial – tendo como base 2,19 milhões de matrizes de pequeno, médio e grande portes. Os dados são do Monitor RGF de Recuperação Judicial, desenvolvido pela consultoria RGF & Associados, que não incluem microempresas.

O número de companhias em processos de reestruturação – considerando entradas e saídas – aumentou em 173 no quarto trimestre do ano, saindo de 3.872 para 4.045.O estoque, no fim do primeiro semestre, estava em 3.823 processos e esse número já era considerado bastante alto pelo sócio da RGF, Rodrigo Gallegos, e pela consultora Roberta Gonzaga.

Os maiores índices de recuperação judicial, de acordo com o Monitor RGF, estão nos setores de cultivo de cana-de-açúcar, construção de rodovias e ferrovias, fabricação de laticínios, de transporte rodoviário coletivo de passageiros, com itinerário fixo, municipal e de fabricação de máquinas e equipamentos para agricultura e pecuária, exceto para irrigação – com base na Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE).

O aumento no número de empresas em recuperação ocorreu porque a quantidade de novos processos foi maior do que a de processos encerrados. No quarto trimestre, 357 empresas entraram em recuperação, mais que o dobro da quantidade no terceiro trimestre do ano. E 184 saíram – 110 delas retornaram à operação normal.

Um conjunto de fatores explica esse crescimento. Mas o que mais pesa, de acordo com Rodrigo Gallegos e Roberta Gonzaga, da RGF, é a alta taxa de juros. As empresas se alavancaram com a oferta de crédito quando os juros estavam baixos. Durante a pandemia, em 2020, a Selic esteve em 2%. Agora, em meio a quedas, está em 11,25%

“As empresas ainda estão muito estranguladas com o custo da dívida”, diz Gallegos. Ele lembra que hoje, ao contrário do período de pandemia, não existe mais tanta margem para negociação. Naquela época, os credores estavam mais benevolentes – concedendo prazos de carência e permitindo o alongamento da dívida.

Essa explosão em 2023, afirmam especialistas, é, em parte, fruto de uma demanda reprimida da pandemia da covid-19. “A crise que estava acontecendo foi sendo adiada. Muitos bancos renegociaram prazos e estavam repactuando as dívidas das empresas, mas não estava se resolvendo o problema fundamental: o de alto endividamento”, diz o advogado Oreste Laspro, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e sócio da Laspro Consultores, uma das bancas pioneiras em administração judicial no Brasil.

Laspro foi nomeado administrador judicial da SouthRock Capital – dona de várias redes de restaurantes como Starbucks, TGI Fridays e Subway -, que entrou em recuperação judicial em 2023. O pedido foi feito em 31 de outubro, mas só foi aceito mais de um mês depois, no dia 12 de dezembro (processo nº 1153819- 28.2023.8.26.0100).

Um dos maiores e mais polêmicos processos do ano foi o da 123milhas. A companhia bateu à porta do Judiciário, no mês de agosto, com mais de R$ 2 bilhões em dívidas e cerca de 700 mil credores para negociar – a maioria pessoas físicas (processo nº 5194147-26.2023.8.13.0024).

Na lista do ano ainda consta a M.Officer, do setor de vestuário. As dívidas da empresa são da ordem de R$ 53,5 milhões, fruto de uma queda de 91% das vendas durante a pandemia da covid-19, segundo informou nos autos. Aspectos concorrenciais pela “entrada dos gigantes players asiáticos no cenário nacional” e dificuldade no acesso a crédito com bancos também influenciaram (processo nº 1123916-45.2023.8.26.0100).

Esse cenário afetou de forma mais aguda o setor de serviços e as micro e pequenas empresas. “Elas ficam mais sufocadas por conta do mecanismo do negócio. Com qualquer grande oscilação, dificuldade e, ainda mais em um cenário de incerteza econômica, elas não conseguem ter estrutura organizacional e fôlego para renegociar”, afirma Samantha Longo, sócia do Bichara Advogados e integrante do Fórum Nacional de Recuperação Empresarial e Falências (Fonaref) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O aumento da demanda foi percebido no dia a dia dos escritórios, como no Thomaz Bastos, Waisberg, Kurzweil Advogados. “Foi um ano bastante agitado, com uma procura muito maior que nos últimos cinco anos, desde exame de possíveis medidas a protocolar os processos”, afirma o advogado Ivo Waisberg, sócio da banca. Ele atua em uma das maiores recuperações, a da Americanas, cuja dívida é de R$ 42,5 bilhões (processo nº 0803087-20.2023.8.19.0001), como representante do Bradesco, e também nos processos da SouthRock Capital e da 123milhas.

Embora os sinais de melhoria, como a queda da inflação e das taxas de juros, tenham começado a surgir, a reação no cenário de recuperação judicial é mais lenta e a tendência de alta deve ser manter pelo menos durante este primeiro semestre. “A economia está melhorando, mas a recuperação das empresas não acompanha no mesmo ritmo, acaba tendo um efeito retardatário, então o número de pedidos ainda deve aumentar, pelo menos, durante o primeiro semestre”, diz a advogada Juliana Bumachar, sócia do escritório Bumachar Advogados Associados.

FONTE: VALOR ECONOMICO – POR ARTHUR ROSA E MARCELA VILLAR — DE SÃO PAULO

 

 

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