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STJ DETERMINA A CREDORES LIBERAÇÃO DE GARANTIAS DE EMPRESA EM RECUPERAÇÃO

31 de maio de 2019

Marco Aurélio Bellizze: se o plano depagamento não for cumprido, os credoresterão reconstituídos os seus direitos egarantias.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou o entendimento que vinha sendoadotado no Judiciário sobre as garantias apresentadas por empresas emrecuperação judicial ou por seus avalistas antes do processo. Os ministros da3ª Turma entenderam, em decisão recente, que se o plano aprovado emassembleia-geral prevê a liberação das garantias, todos os credores têm de sesubmeter ao que ficou decidido – mesmo aqueles que votaram contra.

A decisão é um “balde de água fria” especialmente para os bancos, que são osprincipais detentores das garantias nos processos de recuperação judicial,afirmam advogados. Antes dela, o entendimento era o de que somente aquelescredores que concordaram com a cláusula ficariam sujeitos a ela.

Os que votaram de forma contrária, então, não seriam afetados. Eles poderiam, por exemplo, ir atrás do seu crédito com oterceiro que garantiu a dívida da empresa e que não é parte do processo de recuperação judicial. Escapariam, assim, dascondições de pagamento fixadas no plano – que geralmente preveem prazos de carência, descontos e parcelamentos.

“Essa decisão do STJ pode mexer com o mercado” diz Álvaro Arantes, sócio do escritório Muriel Medici Franco Advogados.”O aumento do risco vai levar ao aumento do preço do crédito e à exigência de alienação fiduciária [garantias que ficamfora dos processos de recuperação judicial]”, ele chama a atenção.

O advogado entende que os ministros não poderiam ter liberado a possibilidade de se “transacionar direito alheio”, o que,na prática diz ter ocorrido – já que credores e a empresa devedora estariam negociando um direito que pertence a um outrocredor e que envolve um terceiro que sequer participa das discussões do processo de recuperação.

Ele afirma ainda que a Lei de Recuperação Judicial e Falências (nº 11.101, de 2005) trata do tema de forma expressa.Consta no parágrafo 1º do artigo 49 que “os credores do devedor em recuperação judicial conservam os seus direitos eprivilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”. Já o artigo 50 dispõe que “a supressão de garantia ousua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da garantia”.

A matéria foi decidida, no STJ, por maioria de votos e com placar apertado: três ministros decidiram por aplicar a cláusulada liberação das garantias a todos os credores e dois se posicionaram contra. Prevaleceu o voto divergente ao do relator,que foi proferido pelo ministro Marco Aurélio Bellizze.

Ele interpretou a questão com base no artigo 49 da lei, mas de acordo com o que consta no parágrafo 2º, que prevê ascondições originalmente contratadas “salvo se ficar estabelecido de modo diverso no plano de recuperação judicial”. Adecisão da maioria dos credores, na assembleia-geral, afirmou o ministro, vale para aqueles que votaram contra o plano etambém para quem não votou ou não compareceu no dia da assembleia.

“Compreensão diversa, por óbvio, teria o condão de inviabilizar a consecução do plano, o que refoge dos propósitos doinstituto da recuperação judicial”, destacou Marco Aurélio Bellizze. Ele fez a ressalva, porém, de que se o plano depagamento não for cumprido pela empresa devedora, tal como aprovado na assembleia-geral, “os credores terãoreconstituídos os seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas”.

Esse entendimento foi seguido pelos ministros Moura Ribeiro e Paulo de Tarso Sanseverino. O relator, ministro Villas BôasCueva, que ficou vencido, foi acompanhado pela ministra Nancy Andrighi. A 3ª Turma analisou esse tema por meio de umrecurso (REsp nº 1.700.487) apresentado pela Ariel Automóveis Várzea Grande, uma empresa com sede em Mato Grosso,contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-MT) que havia vetado a liberação das garantias.

Especialista na área de recuperação judicial e falências, o advogado Julio Mandel, sócio do Mandel Advocacia, entende quea decisão do STJ traz equilíbrio para os processos. Os bancos, podendo executar os terceiros, ele diz, perdem o interesse narecuperação da empresa, o que não condiz com o que propõe a lei.

“Quando o plano é aprovado, existe a novação da dívida e se a empresa cumprir o que foi acordado em assembleia não hámotivo para o credor executar o terceiro. A companhia não estará inadimplente”, afirma.

O advogado, assim como decidiu a 3ª Turma do STJ, considera a assembleia-geral como soberana e válida a todos oscredores que estão sujeitos ao processo de recuperação judicial. Esse tema, no entanto, ainda não foi julgado em repetitivo.Serve como precedente para outros casos em análise do Judiciário. Há ainda a possibilidade de recurso para a 2ª Seção,que uniformiza os julgamentos das turmas de direito privado da Corte (3ª e 4ª).

A reportagem não localizou os representantes da empresa Ariel Automóveis Várzea Grande, que tem sede em Mato Grossoe é parte no processo, para comentar a decisão.

FONTE: Valor Econômico – Por Joice Bacelo

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