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PGFN REGULAMENTA DISPENSA DE GARANTIA EM AÇÕES JUDICIAIS

21 de janeiro de 2025

Medida vale para processos que questionem decisões do Carf por voto de qualidade.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) regulamentou a dispensa de garantia para processos judiciais que questionem decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) por voto de qualidade. A medida está Portaria nº 95, publicada na edição de ontem do Diário Oficial da União.

A norma foi editada em razão da Lei nº 14.689, de 2023, que trouxe de volta o voto de qualidade – o desempate pelo presidente da turma julgadora, que é representante da Fazenda – e prevê algumas facilidades para os contribuintes. A que dispensa a apresentação de garantia está no artigo 4º.

Apesar da previsão legal, a Fazenda Nacional resistia a aceitar ações sem garantia por falta de regulamentação, que veio agora e prevê que essa dispensa é facultativa – ou seja, o contribuinte pode optar por oferecer uma garantia tradicional. A medida vale para contribuintes com capacidade de pagamento.

A questão, até então, estava sendo resolvida no Judiciário e os juízes vinham dando razão aos contribuintes para suspender a exigência. De acordo com Maria Rita Ferragut, sócia de tributário do Trench Rossi Watanabe, a fundamentação era, muitas vezes, a falta de regulamentação.

Foi o caso, por exemplo, da Monsanto, que em julho de 2024 conseguiu suspender a exigência de garantia no questionamento de um auto de infração (processo nº 5018307-85.2024.4.03.6100). Agora, com a edição da portaria, afirmam tributaristas, os pontos levados à Justiça devem mudar.

O tópico da capacidade de pagamento é o que mais preocupa, segundo eles. Maria Raphaela Matthiesen, tributarista da Mannrich & Vasconcelos, diz que, embora já estivesse previsto na lei de 2023 que a capacidade de pagamento deve ser aferida com base no patrimônio líquido da empresa, a portaria foi além. Estabeleceu que deve ser calculado pelo método do “patrimônio líquido realizável ajustado”.

A principal preocupação dos tributaristas é a respeito de como será feito esse cálculo, e que a fórmula acabe, na prática, por chegar a um patrimônio líquido do contribuinte menor do que o que ele efetivamente dispõe, inviabilizando a dispensa da garantia. “Um ativo alienado a valor justo não necessariamente vai aparecer com o mesmo valor pelo critério ‘realizável ajustado’, e isso pode acabar reduzindo o patrimônio líquido do contribuinte”, diz Maria Raphaela.

E se o contribuinte tiver meios de demonstrar que o cálculo da PGFN realmente o prejudicou, a divergência pode levar a um aumento de questionamentos judiciais sobre o tema, segundo Maria Rita Ferragut. “Não sabemos qual vai ser a régua. Isso não foi regulamentado. Mas vamos ter que esperar para ver como o cálculo vai ser feito na prática para saber se há espaço para questionamento judicial”, afirma.

Outra insegurança gerada por um vácuo na redação, de acordo com os especialistas, diz respeito ao artigo 5º, que estabelece que a análise do requerimento de dispensa será feita em até 30 dias. Não fica claro, no entanto, diz Maria Raphaela, se o contribuinte que precisar comprovar a regularidade tributária durante esse intervalo não será prejudicado pelo período de análise.

A tributarista aponta, ainda, que o artigo 7º da portaria, que prevê as possibilidades de revogação da dispensa, deveria ter especificado que as discussões judiciais com resultado favorável à Fazenda deveriam ser em caráter definitivo. “Do jeito que está, a regularidade fiscal já pode ser inviabilizada enquanto o recurso ainda está sendo analisado em primeira instância, por exemplo.”

Maria Rita Ferragut, por sua vez, aponta que outra omissão importante, e que pode aumentar o volume de questionamentos judiciais, envolve processos que já estão em andamento e garantidos de outras formas, por empresas que teriam condições de pleitear a dispensa da garantia. “A portaria só trata dos débitos futuros, mas também não proíbe a substituição para os não garantidos. Então, essa possibilidade poderia levar ao aumento de pedidos judiciais”, afirma.

No entanto, segundo as especialistas, o efeito da regulamentação é majoritariamente positivo. Nem que seja apenas por acabar com a situação de insegurança que vigorou por um ano, em que havia previsão legal, mas não regulamentação. Para Maria Rita, chama atenção o fato de a norma não tratar a dispensa como dispensa, e sim como critério alternativo de garantia. Essa leitura é possível, acrescenta, a partir do artigo 3º, inciso I. O dispositivo diz textualmente que a regularidade fiscal “é forma de garantia facultativa do crédito tributário”.

Para ela, essa leitura beneficiaria especialmente empresas que têm movimentação financeira muito grande, mas pouco patrimônio, como as de tecnologia, agronegócio e setor financeiro. “Como a portaria está considerando que a regularidade fiscal é uma forma de garantia e a PGFN permite que se tenha um mix de garantias, se a empresa tiver patrimônio inferior à dívida fiscal, a regularidade supriria a necessidade de garantia até o valor do bem. Para o que excedesse, precisaria apresentar outra forma de garantia.”

No Carf, as decisões tomadas por voto de qualidade são a minoria – em 2024, representaram 3,7% do total. Até outubro, segundo o órgão, enquanto os 1.971 processos decididos por maioria discutiram R$ 205 bilhões, os 17.619 processos resolvidos por unanimidade movimentaram R$ 409 bilhões e os 755 por voto de qualidade, R$ 139 bilhões.

Procurada Pelo Valor, a PGFN não se manifestou até o fechamento da edição.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR LUIZA CALEGARI — DE SÃO PAULO

 

 

 

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