Em meu artigo anterior, enderecei o risco verificado no sistema de precedentes administrativos proposto pela reforma tributária como um aceno direto à complexidade que ora combatemos. Desta vez, a inquietação, compartilhada tanto por operadores da Justiça como por advogados que militam no foro, envolve, novamente, o outro desconhecido do jabuticabal.
O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), já sabemos, será um tributo de governança compartilhada entre estados e municípios que hospedem o local das operações, nos termos definidos pelo artigo 11 do Projeto de Lei Complementar nº 68/2024 [1]. O princípio do destino, no entanto, não basta para determinar a legitimidade passiva nas ações judiciais que discutam atos que escapam à administração tributária dos estados e municípios.
Sob o novo federalismo fiscal, os atos relativos ao lançamento e à cobrança seguem sob a competência das administrações tributárias subnacionais, enquanto o recolhimento e distribuição do produto arrecadado, bem como o ressarcimento dos créditos, foram outorgados ao Comitê Gestor do IBS (CG-IBS).
A sofisticação tecnológica exigida por uma entidade dessa magnitude sinaliza uma implementação pedregosa, demorada, na qual faltas operacionais são facilmente previsíveis.
Personalidade jurídica do CG-IBS
Em um cenário de recolhimento a maior ou mesmo de ressarcimento indevido de créditos tributários, a quem pertence a legitimidade passiva em uma ação judicial? Seria ao estado ou município onde se deu a obrigação tributária? Mas o recolhimento do IBS é realizado perante o Comitê Gestor. Então seria ele parte legítima para compor o polo passivo? Se afirmativo, o deveria o postulante incluir estado e município interessados como litisconsortes?
O CG-IBS, como observado anteriormente [2], é uma unidade sui-generis tanto em nossa história institucional como na experiência global em tributação sobre valor agregado. A Constituição Federal, bem como o PLP nº 108, assentam sua independência técnica e administrativa, o que, pelo vernáculo publicista, se traduz em pessoa jurídica de direito privado. Porém, tanto a EC nº 132/2024 como o PLP nº 108 são omissos quanto à sua personalidade jurídica.
O argumento pela sua autonomia jurídica é reforçado pela previsão de uma diretoria das procuradorias em sua estrutura, cuja representação judicial, todavia, é restrita aos agentes públicos do CG-IBS quanto “a atos praticados no exercício regular de suas atribuições constitucionais, legais ou regulamentares, no interesse público”, nos termos do artigo 38, IV [3]. Os agentes a serviço do Comitê Gestor, portanto, podem ser representados judicialmente, mas não o próprio Comitê Gestor.
Assim, o denodo pelo legislador complementar da responsabilidade por faltas ocorridas no âmbito do CG-IBS é tão urgente para a reforma tributária como a aprovação dos seus estatutos regulamentares, agora prorrogada pelas eleições municipais e sujeitas aos ânimos que permeiam a eleição das Mesas Diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado.
Na hipótese de a questão não ser solucionada até sanção presidencial, não é senão justo e acertado que estados e municípios não sejam acionados judicialmente por atos alheios à sua competência, de modo que a conclusão mais salutar é, sim, pela legitimidade passiva do Comitê Gestor.
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[1] PODER EXECUTIVO. Projeto de Lei Complementar nº 68. Brasília, 2024.
[2] Merheb. Pedro. O direito administrativo do Comitê Gestor. Conjur, 2024.
[3] PODER EXECUTIVO. Projeto de Lei Complementar. Brasília, 2024.
Com informações da Câmara dos Deputados -Zeca Ribeiro
FONTE: CONSULTOR JURÍDICO – POR PEDRO MERHEB