PRORROGAÇÃO DA DESONERAÇÃO DA FOLHA: O CLÁSSICO ‘PRESENTE DE GREGO’
23 de setembro de 2024
A tão aguardada publicação da Lei nº 14.793, de 16 de setembro de 2024, foi recebida com expectativa por diversos setores produtivos que se beneficiavam da contribuição substitutiva, desonerando suas folhas de pagamento.
O detalhe amargo é que essa benesse tão esperada veio acompanhada de um ajuste fiscal que penaliza muitos outros setores produtivos. O “cavalo de Troia” da vez foi a alteração arbitrária e inconstitucional na sistemática de remuneração dos depósitos judiciais.
Há mais de duas décadas, desde a promulgação da Lei nº 9.703/98, os depósitos judiciais de tributos federais são atualizados pela Selic, um índice que engloba tanto correção monetária quanto juros moratórios.
No entanto, com a nova Lei nº 14.973/24, mais especificamente no inciso II do artigo 37, o levantamento de depósitos judiciais pelo contribuinte, quando autorizado pelo Poder Judiciário, passará a ser “acrescido de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação”.
Correção fica distorcida
Resumidamente, a nova legislação substitui a Selic, que hoje está 10,75 % ao ano, pelo IPCA, que hoje está em 4,24%.
Com isso, a Lei nº 9.703, de 17 de novembro de 1998, foi revogada por completo, resultando em uma distorção legal sádica.
De plano, aponto as seguintes violações:
- Violação ao princípio da segurança jurídica e da confiança legítima: Os depósitos judiciais de tributos federais vêm sendo corrigidos pela Selic há mais de duas décadas, desde a Lei nº 9.703/98. A substituição repentina desse índice pelo IPCA, que reflete apenas a correção monetária, gera uma quebra na expectativa legítima dos contribuintes que depositaram seus valores sob a premissa de uma correção composta por juros e inflação.
- Violação ao direito de propriedade: A Selic, ao englobar juros moratórios, reflete o custo de oportunidade do dinheiro, enquanto o IPCA corrige apenas pela inflação. Isso cria um descompasso entre o que foi originalmente depositado e o que será restituído, resultando em uma espécie de confisco indireto, violando o direito de propriedade, previsto no artigo 5º, XXII, da Constituição.
- Violação ao princípio da isonomia: A mudança impõe uma discriminação injustificada entre o Fisco e os contribuintes. Enquanto os tributos devidos permanecem corrigidos pela Selic, os valores depositados pelos contribuintes para garantir esses tributos passam a ser atualizados apenas pelo IPCA, gerando uma clara disparidade em violação ao princípio da isonomia, previsto no artigo 5º da Constituição.
- Violação ao princípio da moralidade: A alteração no regime de correção é medida disfarçada para promover um ajuste fiscal às custas dos contribuintes, o que poderia ser enquadrado como uma violação ao princípio da moralidade administrativa, previsto no artigo 37 da Constituição.
Enfim, que a verdade seja dita: A “desoneração” onera muito!
FONTE: CONSULTOR JURÍDICO – POR LUIZ GUILHERME GOUVEIA SPERANDIO