A controvérsia acerca da aplicação da prescrição intercorrente às infrações aduaneiras não é nova. Em resumo, a Lei nº 9.873/1999, em seu artigo 1º, § 1º, dispõe que incide, de ofício ou mediante requerimento, a prescrição intercorrente nos processos administrativos paralisados por mais de três anos, pendentes de julgamento ou despacho, exceto em relação aos processos administrativos de natureza tributária, conforme seu artigo 5º.
Nesse contexto, o cerne da questão é a definição da natureza das multas decorrentes de infrações aduaneiras. De um lado, a Receita Federal argumenta que essas penalidades dão efetividade ao cumprimento das obrigações aduaneiras e, portanto, à arrecadação dos tributos incidentes nessas operações. Os autuados, por sua vez, defendem que as penalidades aduaneiras têm natureza administrativa, sem relação direta com os fatos geradores dos tributos incidentes nas respectivas operações.
Em esfera administrativa, o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) se ampara em sua Súmula nº 11, que estabelece que “não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal” para afastar os pleitos de prescrição intercorrente em processos aduaneiros, o que resulta na ausência de uma discussão mais qualificada, em esfera administrativa, sobre a natureza das multas aplicadas nesses casos. É importante destacar, no entanto, que a referida súmula foi editada com base em precedentes que tratavam de matéria tributária, não aduaneira.
Precedente do STJ
Por essa razão, o debate específico da questão foi mais bem desenvolvido nos últimos anos pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). Em maio de 2023, a ministra Regina Helena Costa, integrante da 1ª Turma do tribunal, foi relatora do Recurso Especial (REsp) nº 1.999.532/RJ, em que a corte decidiu, por unanimidade, manter a aplicação da prescrição intercorrente, uma vez que “conquanto parcela das obrigações aduaneiras, a título reflexo, auxiliem a fiscalização das exigências fiscais, tais normas apresentam feição puramente vinculada ao Direito Administrativo”.
No último dia 15, a 2ª Turma do STJ também se posicionou sobre o tema, por meio do julgamento do REsp nº 1.942.072/RS, sob relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, por maioria de votos, no mesmo sentido do precedente da 1ª Turma, em acórdão ainda pendente de publicação. Ou seja, foi estabelecido o entendimento da 1ª Seção do STJ no sentido de que a prescrição intercorrente se aplica às multas de natureza aduaneira.
Evolução
Embora os acórdãos não tenham caráter vinculante, eles evidenciam uma evolução importante na jurisprudência, consolidando o entendimento da 1ª Seção do STJ e, consequentemente, uma relevante estratégia processual que pode ser adotada por autuados em matéria aduaneira. Além disso, renova-se a expectativa de que, com essa consolidação de entendimento, o Carf reavalie a sua posição de aplicar indistintamente a sua Súmula nº 11 aos casos que tratam de infrações aduaneiras.
FONTE: CONSULTOR JURÍDICO – POR RAFAEL GREGORIN E GIAN CARLO EVASO