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STJ IMPEDE COBRANÇA DE CAUÇÃO ANTES DE PEDIDO DE FALÊNCIA

11 de julho de 2024

Decisão do ministro Marco Buzzi veda que credor tenha que depositar valores como condição para análise do processo.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o juiz de primeira instância não pode condicionar o recebimento de pedido de falência ao pagamento de caução por credor – valor para assegurar futura remuneração do administrador judicial quando o processo é aceito. A decisão, considerada inédita, é do ministro Marco Buzzi e transitou em julgado (não cabe mais recurso) no fim de junho.

O entendimento é importante por discutir o momento para a exigência da caução, que passou a ser prevista no ano de 2020, com a edição da Lei nº 14.112, que alterou a Lei de Falências e Recuperação Judicial (nº 11.101, de 2005). No STJ, a jurisprudência já se consolidou para admitir a medida em casos excepcionais – como quando a massa falida não tem recursos para custear o administrador judicial.

A caução, segundo especialistas, é uma forma de impedir que credor use pedido de falência como uma espécie de “ação de cobrança”. Neste ano, até maio, foram apresentados 363 pedidos de falência no país, segundo levantamento da Serasa Experian. No ano passado, foram 983.

No caso julgado pelo STJ, o credor resolveu ajuizar pedido de falência depois de não conseguir cobrar dívida de aluguel comercial, de cerca de R$ 200 mil no ano de 2022.  Ele não encontrou bens para penhora.

O juiz, porém, condicionou o recebimento da petição inicial ao prévio depósito de caução no valor de R$ 4 mil para garantir as custas judiciais. Como o credor não concordou, o processo foi extinto. Em seguida, a decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF).

De acordo com a decisão do TJDF, o administrador judicial deve receber remuneração, custeada ou pelo devedor ou pela massa falida, segundo o artigo 25 da Lei de Falências e Recuperação Judicial. E cabe ao juiz impor, ao credor, a prestação de caução ou o pagamento da quantia necessária às despesas e aos honorários do administrador judicial, conforme o artigo 114-A, parágrafo 1°, da mesma legislação, acrescido pela Lei n° 11.112/2020.

Para os desembargadores, “o depósito da remuneração do administrador é pressuposto processual específico da ação de falência” e o descumprimento da ordem de depósito enseja a extinção do processo de falência.

O credor, então, recorreu ao STJ. De acordo com o advogado da parte, Gustavo Penna Marinho, do escritório PMA Advogados, não há previsão em lei para a cobrança de um “depósito prévio” e, por isso, o juiz não poderia condicionar o recebimento da petição inicial de falência ao pagamento de caução. Ele acrescenta que, além de a medida não ser “nada razoável”, não haveria provas de que a futura massa falida não teria condições de arcar com a remuneração do administrador judicial.

Ao analisar o recurso, o ministro Marco Buzzi, considerou que a situação enfrentada é diferente de outras já analisadas pelo próprio STJ. Ele destaca, na decisão, que a jurisprudência da Corte admite que o credor seja obrigado a depositar uma caução para cobrir as custas judiciais da falência caso a devedora não seja encontrada ou não tenha recursos – cita, como exemplo o REsp 1784646.

Mas, nesse caso, afirma, a situação é diversa porque essa exigência foi feita como requisito para o recebimento da petição inicial do pedido de falência. “Cotejando os precedentes desta Corte que entendem devida a exigência de caução, constata-se ter a exigência, em regra, ocorrido após a decretação da falência”, diz o ministro, que derrubou a exigência prévia de caução para o processamento do pedido de falência (REsp 2549573).

De acordo com Gustavo Penna Marinho, a decisão é importante para outros credores porque o mero protocolo de pedido de falência já gera uma série de restrições para o devedor, que pode impedir sua quebra por meio do chamado “depósito elisivo”.

Juliana Bumachar, sócia do escritório Bumachar Advogados Associados, lembra que a legislação vem colocando algumas exigências para que se possa requerer a falência do devedor. O primeiro deles foi o limite de pelo menos 40 salários-mínimos de dívida para o requerimento. E em 2020, acrescenta, a Lei nº 14.112 impôs a possibilidade de exigência de caução.

“O que o legislador pretende com esses requisitos é que não se utilize o requerimento de falência como ação de cobrança”, afirma a advogada, acrescentando que existem outros meios para que o credor possa receber. “O credor tem que ter ciência e responsabilidade para não requerer falência por valores ínfimos. Precisa ter consciência de que a decretação de falência significa a paralisação de uma companhia e perdas de empregos.”

Ricardo Amaral Siqueira, sócio do escritório RSSA Advogados, afirma que os tribunais de Justiça, principalmente o de São Paulo, tem exigido essa caução do credor, e essa medida tem sido confirmada no STJ. “Essa nova decisão, ao que parece, somente trata do momento dessa exigência e não da dispensa em si”, diz.

Para ele, depois da citação do devedor e antes da decretação da falência, seria o melhor momento para se exigir esse depósito. “Se o devedor não se manifestar, já é um indício de que não teria condições de arcar com os custos do processo”, afirma o advogado.

Siqueira lembra que a exigência de caução coíbe pedidos de falência que querem apenas fazer pressão para que se pague uma dívida e pedidos contra devedores que não têm nenhum bem para satisfazer seus créditos. “Nesses casos, o credor transfere ao Judiciário um problema que não pode ser resolvido”, diz o advogado. “Muitos desses processos não têm fim, não se localizam os bens, o devedor e o administrador judicial acabam trabalhando de graça. Por isso é muito importante que o credor cubra as custas.

FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR ADRIANA AGUIAR — DE SÃO PAULO

 

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