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INSUMOS DA FASE AGRÍCOLA DÃO DIREITO AO CRÉDITO DE CONTRIBUIÇÕES NÃO CUMULATIVAS

11 de julho de 2024

Por ocasião da votação de súmulas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, a 3ª Turma concluiu que “os gastos com insumos da fase agrícola, denominados de ‘insumos do insumo’, permitem o direito ao crédito relativo à Contribuição para o PIS/Pasep e à Cofins não cumulativas”.

O enunciado decorre dos precedentes nº 9303-009.313, nº 9303-014.128 e nº 9303-014.147, aqui indicados em ordem cronológica.

Em 2019, recorrendo diretamente àquilo que foi decidido pelo STJ por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.221.170/PR (Caso Anhambi) no ano anterior, a turma de conselheiros concluiu que “[c]onsoante o conceito de insumos com fulcro na pertinência e essencialidade ao processo produtivo, devem ser reconhecidos como insumos os itens ora em discussão no presente recurso, tanto aqueles utilizados na fase agrícola quanto no processo de fabricação do produto da Contribuinte”.

Quatro anos depois, no acórdão nº 9303-014.128, aquela 3ª Turma adentrou matéria fática envolvendo a produção de cana de açúcar para produção de açúcar e de álcool. Novamente pautados no resultado do “Caso Anhambi”, os conselheiros foram além e reconheceram que “uma vez rechaçado o conceito de insumo advindo da legislação do IPI, cai por terra a separação entre a fase agrícola e a industrial das agroindústrias, admitindo-se o creditamento também na fase pré-industrial”.

Partindo desse entendimento, a Turma atingiu a inafastável conclusão de que os critérios de essencialidade e relevância devem ser auferidos a partir da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte, não bastando o creditamento sobre bens e serviços qualificados como insumos na própria industrialização.

Em parte, o acórdão nº 9303-014.147 confirmou esse entendimento, reconhecendo que “[a] fase agrícola integra o processo de produção como um todo”, de forma que gastos (essenciais e relevantes) com insumos ali incorridos, “na medida em que constituem elementos estruturais e inseparáveis do processo produtivo global, devem gerar direito ao crédito das contribuições sociais não cumulativas”.

Como é habitual, a Fazenda Nacional pretendia a rigorosa vinculação do insumo à etapa de industrialização, mas os conselheiros reconheceram que o conceito “insumo” deve ser observado no âmbito do ciclo produtivo da pessoa jurídica, noção essa mais ampla do que a efetiva produção.

A evolução da jurisprudência administrativa, agora afirmada em enunciado sumular, de observância obrigatória para todos os membros dos colegiados do Órgão, nos termos do artigo 72 do Ricarf (Portaria MF 1.634, de 21 de dezembro de 2023), ganha especial destaque na medida em que meses antes, o governo federal enviou ao Congresso Nacional o projeto de regulamentação do novo sistema de tributação do consumo, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, que institui a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), a ser gerida pela União, ao lado do imposto dos estados, municípios e Distrito Federal.

Redução de alíquotas de IBS e CBS

No que aqui nos interessa, preocupa que o aprimoramento jurisprudencial compartilhe holofotes com preocupante esboço de regras acerca de insumos agropecuários. Explica-se.

O artigo 9º, § 1º da Emenda Constitucional nº 132/2023 (altera o Sistema Tributário Nacional) previu a redução de 60% das alíquotas do IBS e CBS em operações beneficiadas com insumos agropecuários e aquícolas:

Art. 9º A lei complementar que instituir o imposto de que trata o art. 156-A e a contribuição de que trata o art. 195, V, ambos da Constituição Federal, poderá prever os regimes diferenciados de tributação de que trata este artigo, desde que sejam uniformes em todo o território nacional e sejam realizados os respectivos ajustes nas alíquotas de referência com vistas a reequilibrar a arrecadação da esfera federativa.

§1º A lei complementar definirá as operações beneficiadas com redução de 60% (sessenta por cento) das alíquotas dos tributos de que trata o caput entre as relativas aos seguintes bens e serviços: (…)

XI – insumos agropecuários e aquícolas;

O que se esperava era que o novo tratamento jurídico a ser conferido ao setor agropecuário representasse um compromisso com a desoneração das atividades, afinal “a tributação segundo o arquétipo traçado pela Constituição constitui garantia dos contribuintes”, conforme magistério de Paulo Ayres Barreto [1].

Acontece que o citado PLP 68/2024, em seu papel de regulamentar o benefício, colocou por água abaixo qualquer oportunidade nesse sentido. O artigo 127 do texto proposto pelo Governo Federal restringe os efeitos da norma constitucional a apenas alguns insumos agropecuários, ou, para ser mais exato, a 25 itens a serem registrados em órgão competente do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) conforme as respectivas classificações da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM/SH).

Caso aprovada nesse ponto, a proposta representará um grave retrocesso legislativo.

Durante anos, fisco e contribuintes se digladiaram acerca do conceito de insumo e sua abrangência, se restrita à etapa de industrialização ou alinhada à atividade econômica desempenhada.

O Carf, órgão máximo de julgamento em matéria tributária no âmbito do Poder Executivo, pretendendo resolver definitivamente a prolongada controvérsia, vinculou seus julgadores à tese definida pelo STJ por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.221.170/PR, reconhecendo a clara demarcação de que o parâmetro para se aferir o direito aos créditos é a atividade econômica. Apesar disso, em tão pouco tempo, os contribuintes voltam a viver sob a marca da insegurança.

Isso representaria uma contradição por parte do governo federal? Independentemente da resposta, as consequências dessa ação poderão emergir em futuras discussões.

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[1] BARRETO, Paulo Ayres. BARRETO, Simone Rodrigues da Costa. Competência tributária e o critério material do IBS. In: VERGUEIRO, Camila Campos. BRITTO, Lucas Galvão de. CARVALHO, Paulo de Barros. A reforma do sistema tributário nacional sob a perspectiva do constructivismo lógico-semântico – o texto da emenda constitucional 132/2023. São Paulo: Editora Noeses, 2024, pp. 177-184.

FONTE: CONSULTOR JURIDICO – POR GUILHERME SIMÕES MARINHO

 

 

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