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60 DIAS DE NEBLINA AO CONTRIBUINTE

1 de fevereiro de 2023

Mais do que aumento de carga tributária, grande parte das alterações implementadas nos últimos 60 dias carregam dúvidas, aparentes ilegalidades e a certeza de aumento de litigiosidade.

Em meio a um verão bastante chuvoso, chama a atenção a grande quantidade de novas normas nesta transição de governo.

Apenas no plano federal, foram 40 leis ordinárias no mês de dezembro de 2023 e outras 20 leis ordinárias em janeiro de 2023, fora uma tempestade de medidas provisórias, instruções normativas e atos infralegais. E ainda temos as leis estaduais e municipais a engrossar o caldo.

Mais do que a quantidade, chama a atenção as significativas alterações levadas a efeito na área tributária que, não fugindo à tradição manicomial, tornam a vida do contribuinte um verdadeiro inferno.

No apagar das luzes de 2022, vários Estados da Federação, alegando a necessidade de ajuste fiscal, promoveram o aumento da alíquota ordinária do ICMS para 19% (AC, AL, BA, PA e PR), 20% (RN), 21% (PI) ou 22% (SE).

Além de afetar diretamente os estabelecimentos localizados nos Estados que promoveram o aumento da alíquota, as alterações impactam os contribuintes de todo o Brasil que destinarem a esses Estados mercadorias sujeitas à substituição tributária e/ou ao recolhimento do Diferencial de Alíquotas – Difal. Estes aumentos devem obedecer à regra constitucional da anterioridade, sendo aplicáveis a partir do exercício de 2023 e após 90 dias contados de sua publicação.

Em 29 de dezembro de 2022, a Medida Provisória nº 1.152 alterou as regras de preços de transferência brasileiras visando adequá-las ao modelo adotado internacionalmente. As alterações nas metodologias de cálculo dos ajustes afetam a apuração do IRPJ e CSLL das empresas multinacionais que realizam negócios entre partes relacionadas e países com tributação favorecida, levando assim à necessidade de uma revisão das políticas de preço e controles internos nessas operações.

Após a publicação da Medida Provisória nº 1.147/2022, que alterou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), o Governo Federal publicou, no último 02 de janeiro, a Portaria nº 11.266/2022, que restringiu de 88 para 38 os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que são elegíveis aos benefícios fiscais do PERSE.

A Portaria PGFN nº 10.826/2022 regulamentou os requisitos, documentação e procedimentos necessários para quitação de débitos inscritos em dívida ativa da União com crédito líquido e certo de decisões transitadas em julgado e precatórios.

No dia 31 de dezembro de 2022 foi publicado o Decreto nº 11.322 estabelecendo a redução nas alíquotas de PIS e COFINS (de 4,65% para 2,33%) incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas empresas que apuram as contribuições no regime não-cumulativo, a partir de 1º de janeiro de 2023. Em 02 de janeiro de 2023, entretanto, foi publicado o Decreto nº 11.374, revogando o Decreto nº 11.322/22 para restabelecer a alíquota anterior.

No dia 02 de janeiro de 2023 foi publicada a Medida Provisória nº 1.157, que reduziu as alíquotas de PIS e Cofins sobre determinados combustíveis.

A Medida Provisória nº 1.159 vedou o direito ao crédito do ICMS incluído na base do PIS e da Cofins no regime não-cumulativo deste imposto, alterando norma editada poucas semanas atrás.

Em janeiro, ainda, o novo governo editou a Medida Provisória nº 1.160 que alterou regras fundamentais no processo administrativo fiscal perante o Conselho Administrativo de recursos Fiscais (Carf), como a volta do voto de qualidade e valores de alçada para recursos ao órgão.

Além disso, também houve o restabelecimento da tributação das receitas financeiras pelo PIS e pela Cofins, além de programas de transação tributária no âmbito da Receita Federal do Brasil e outras medidas. São alguns exemplos, mas há ainda mais.

É difícil crer na frase segundo a qual “neblina que baixa, sol que racha”. Ao menos na perspectiva dos contribuintes, há previsão de uma grande e incontrolável tempestade após dissipar a nebulosidade que paira sobre o sistema tributário nacional.

Mais do que aumento de carga tributária, grande parte das medidas implementadas nestes últimos 60 dias carregam elevada carga de dúvidas, aparentes ilegalidades e a certeza de um aumento de litigiosidade, com inevitável deterioração nas relações entre o fisco e os contribuintes. Somos todos perdedores!

Estamos na contramão do comando que impõe às autoridades públicas o dever de atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas. Ao final, parece que o desejo de arrecadar é tão grande quanto o desinteresse de reduzir despesas públicas para satisfazer as necessidades inesgotáveis de gastos públicos.

FONTE: Valor Econômico – Por Eduardo Salusse – São Paulo

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