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STJ JULGARÁ DISCUSSÃO BILIONÁRIA SOBRE EMPRÉSTIMOS AGRÍCOLAS

27 de janeiro de 2023

Corte Especial voltará a analisar correção de cédulas de crédito rural.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começa o ano com o julgamento de uma questão que tramita há cerca de 30 anos no Judiciário e pode ter forte impacto para o Banco do Brasil e também para a União e o Banco Central, como devedores solidários. Trata-se do índice a ser aplicado para correção monetária de cédulas de crédito rural no mês de março de 1990 (Plano Collor I), indexadas à caderneta de poupança.

O que está em jogo agora é a possibilidade de essa discussão ter mais um capítulo. A Corte Especial vai definir se a questão poderá ser apreciada pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – que já analisaram os expurgos inflacionários incidentes sobre as contas de poupança atingidas pelos planos econômicos.

No caso dos empréstimos agrícolas, há entendimento, nas duas turmas de direito público do STJ, sobre a aplicação do Bônus do Tesouro Nacional (BTNF), no percentual de 41,28%. Foi adotado, na época, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), de 84,32%.

Essa diferença entre os índices de correção monetária, segundo a ministra Isabel Gallotti, que ainda vai ler seu voto no caso, levaria a um impacto de R$ 239 bilhões aos cofres públicos. Ela revelou esse valor em sessão realizada em outubro.

Pessoas com conhecimento do processo indicaram ao Valor que essa estimativa citada pela ministra teve origem em uma alegação da Advocacia-Geral da União (AGU) no processo quando foi solicitada a suspensão das execuções sobre o tema.

Ainda segundo a fonte, não seria possível calcular o impacto do caso porque o pagamento não seria imediato a partir da decisão do STJ. Dependeria da apresentação de provas em cada caso.

Por enquanto, apenas o relator, ministro Jorge Mussi, votou. Ele aceitou o pedido da União para que a questão seja levada ao Supremo. Já a ministra Isabel Gallotti indicou na sessão realizada em outubro que vai divergir – mas ainda não apresentou o seu voto.

O caso chegou ao STJ há cerca de dez anos. Em 2014, a 3ª Turma do STJ impôs condenação solidária do Banco do Brasil, da União e do Banco Central ao pagamento das diferenças apuradas entre o IPC de março de 1990 (84,32%) e o BTNF fixado em idêntico período (41,28%). Os valores devem ser corrigidos monetariamente, a contar dos pagamentos a maior, pelos índices aplicáveis aos débitos judiciais, acrescidos de juros de mora.

Na decisão, o relator do caso na 3ª Turma, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, afirma que há cerca de 20 anos o STJ pacificou a jurisprudência nesse sentido. “Ao adotar o índice de 84,32% referente ao Índice de Preços ao Consumidor (IPC) de março de 1990 em lugar do índice de 41,28% referente ao BTNF, a instituição financeira demandada descumpriu as cláusulas pactuadas nas cédulas de crédito rural pignoratícias e, especialmente, as disposições normativas previstas na Lei 8.024/90”, diz.

O tema chegou ao STJ por meio de recurso do Ministério Público Federal (MPF), autor da ação civil pública que pede a devolução dos valores aos agricultores, contra decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). O processo foi ajuizado com assistência da Sociedade Rural Brasileira (SRB) e da Federação das Associações de Arrozeiros do Estado do Rio Grande do Sul (Federarroz).

Diversos outros recursos foram apresentados durante a tramitação do caso na Corte. Além do mérito, as discussões no processo já passaram por honorários e até pela abrangência da decisão – como o caso teve origem em ação civil pública, os ministros entenderam que deveria ser nacional (Eresp 1319232).

Em nota ao Valor, o Banco do Brasil (BB) afirma que a sentença coletiva é “ilíquida”. Portanto, acrescenta, não há como estimar, no momento, um valor de eventual desembolso – que poderá impactar seus resultados. Mas lembra que a condenação também foi imposta, de forma solidária, ao Banco Central e à União. “O BB jamais arcará sozinho com tal ônus”, diz.

De acordo com o advogado Antonio Zanette, que atua como representante dos mutuários junto do advogado Ricardo Alfonsin, do escritório Alfonsin Advogados, a 2ª Seção do STJ tem precedentes, desde a década de 90, com o entendimento de que a matéria é infraconstitucional.

Zanette explica que esse caso no STJ é diferente da questão dos expurgos inflacionários incidentes sobre as contas de poupança atingidas pelos planos econômicos – que foi levada ao STF e está sendo resolvida por meio de acordos. Nessa situação, lembra, o Banco do Brasil cobrou uma correção maior que a devida. E segundo o advogado, não haveria dificuldades para a comprovação.

Para a AGU, conforme nota enviada ao Valor, a decisão impugnada “viola todo o sistema financeiro nacional, pois os índices aplicados por determinação das Leis nº 8.027/90 e 8.088/90 foram constitucionais e não violaram o direito adquirido”.

Procurada pelo Valor, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou que não acompanha o assunto, por não se tratar de uma ação setorial, mas de caso específico de uma instituição financeira. O Banco Central afirmou que não comenta processos judiciais em curso.

FONTE: Valor Econômico – Por Beatriz Olivon — De Brasília

 

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