A tese, proferida pela 2ª Seção, era muito aguardada pelas instituições financeiras.
A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou tese, na manhã de ontem, para determinar que os juros remuneratórios sobre os expurgos inflacionários da poupança, determinados pelo Judiciário, devem incidir até o fechamento da conta ou até o saldo ter sido zerado — o que tiver ocorrido primeiro. Essa data, porém, deve ser comprovada pelos bancos.
O entendimento, em recurso repetitivo, teria um impacto bilionário para as instituições financeiras caso o prazo de incidência dos juros fosse maior do que o definido pelo colegiado, como queriam os poupadores. Eles defendiam a correção até a data do efetivo pagamento dos expurgos.
O Banco do Brasil e o Bradesco são as partes envolvidas nos dois recursos especiais julgados (REsp 1877280 e REsp 1877300). Eles citam que há provisões para os processos em seus balanços, mas não especificam os valores.
A controvérsia girava em torno dos processos sobre os expurgos que afetaram as cadernetas de poupança de milhares de brasileiros que conviveram com a inflação dos anos 1980 e início dos anos 1990. A tese só vale para ações civis públicas em que haja a condenação expressa por juros remuneratórios, de 0,5% ao mês, que não se confundem com os juros de mora, de 1% ao mês, aplicáveis a qualquer ação.
A tese foi dividida em duas partes. A primeira foi sugerida pelo relator do caso, ministro Raul Araújo, para quem os juros são uma obrigação acessória, cuja incidência se encerra quando acaba a obrigação principal, que é o investimento na caderneta de poupança. Ele foi acompanhado pelos ministros Humberto Martins e Isabel Gallotti.
O acréscimo veio da ministra Nancy Andrighi, que atribui aos bancos a obrigação de comprovar a data de encerramento da conta ou do saldo zerado. Sem essa prova, a data final de incidência passa a ser a “data da citação na ação civil pública que originou o cumprimento de sentença”.
Concordaram com ela os ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Moura Ribeiro, que apontaram que os esclarecimentos são essenciais para garantir efetividade ao julgado e ajudar os magistrados e jurisdicionados, diante do grande volume de processos a respeito do tema.
Os expurgos inflacionários são a diferença entre o índice de correção monetária aplicado à poupança e o índice real de correção monetária. Quem tinha depósitos na poupança, nos anos de inflação galopante entre 1980 e 1994, perdeu dinheiro, em vez de ser remunerado pelo investimento. Agora, por meio das ações judiciais, esses correntistas conseguiram garantir a correção, nem sempre com a garantia de pagamento dos juros remuneratórios.
O advogado Paulo Cavalcanti, do Cavalcanti Albuquerque Advogados, que representou a poupadora de uma das ações julgadas pelo STJ, destaca que os bancos devem tentar estender o entendimento também para as ações individuais. Ele lembra que a tese também não vale para as ações civis públicas em que a decisão já determinou o termo final da incidência dos juros.
O advogado destaca, como exemplo, o processo da , que foi incorporada pelo , com mais de 500 beneficiários, em que a sentença previu que os juros remuneratórios incidiriam até o início dos pagamentos (processo 0403263-60.1993.8.26.0053).
Marcos Cavalcante de Oliveira, que defendeu o em um dos processos, afirma que os bancos vão fazer “um esforço sincero e intenso” para localizar os documentos que comprovem as datas de fechamento das contas, pois “é no seu próprio interesse” que essa prova será produzida. Ele acrescenta que, embora o ônus seja dos bancos, “a parte também pode fazer a sua prova”, já que os extratos são comuns a ambas as partes.
Os especialistas, no entanto, concordam em um ponto: o de que, ao menos, é positivo que o STJ tenha enfim encontrado uma solução para as controvérsias, que, em alguns casos, já vêm se arrastando há 15 anos, quando transitaram em julgado sentenças sobre o assunto.
Para Oliveira, apesar de alguns pontos não serem favoráveis às instituições financeiras, a mera definição já é positiva. “A conta do impacto final tem que ser feita somando caso a caso, são dezenas ou centenas de milhares de processos, ainda não é possível dizer. Mas saber o que fazer, no geral, é sempre melhor do que ficar na incerteza.”
Apesar desse marco importante, há ainda outra frente de batalha. Em março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) homologou um acordo entre as entidades representativas dos bancos e dos poupadores para encerramento das ações, estabelecendo condições e um cronograma para a adesão dos poupadores. Em dezembro de 2022, a Corte aceitou o pedido de prorrogação do acordo por mais dois anos e meio. Mas ainda faltam ser julgados todos os processos sobre o tema no STF (RE 631363 e RE 632212). Até lá, todos os processos sem trânsito em julgado estão suspensos.
FONTE: VALOR ECONÔMICO – POR LUIZA CALEGARI — SÃO PAULO