Para diretor-geral da CervBrasil, impacto das bets também preocupa, pois o crescimento descontrolado das apostas esportivas tem comprometido o poder de compra das famílias
Somos o terceiro país que mais produz cerveja no mundo. Foram 15,4 bilhões de litros no ano passado – atrás somente da China (46 bilhões de litros) e dos Estados Unidos (22,1 bilhões de litros) -, produzidos por 1.847 cervejarias, que detêm 60.334 marcas.
Apesar da quantidade de players, o mercado é comandado por três potências: Ambev (com 59,3% do market share em 2023), Grupo Heineken (24,4%) e Grupo Petrópolis (11,3%). Os outros 5% ficam com pequenas e médias cervejarias.
Segundo Paulo Petroni, diretor-geral da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), esses 5% são parte importante para o setor e serão muito afetados pelo texto atual da Reforma Tributária. Segundo ele, as mudanças no Simples Nacional podem gerar uma carga tributária muito grande para a categoria, ameaçando os pequenos cervejeiros.
DC NEWS – O mercado brasileiro de cerveja é bastante expressivo no âmbito mundial? Como está o cenário atual da produção?
Somos o terceiro maior produtor de cerveja do planeta. Este ano, a produção deve ultrapassar 15,5 bilhões de litros, colocando o Brasil atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Além disso, a qualidade da nossa cerveja e a capacidade de produção nos colocam entre os principais fabricantes globais.
E no consumo?
O consumo per capita de cerveja no Brasil está em torno de 65 a 70 litros por pessoa por ano, o que nos coloca em uma posição distante de países menores, onde o consumo chega a ultrapassar os 100 litros por habitante.
Quais são os principais fatores hoje que impactam o consumo de cerveja no Brasil?
O consumo de cerveja está diretamente relacionado à disponibilidade de renda. A renda das famílias é afetada por fatores como taxas de juros, inflação e desemprego. Isso, por sua vez, impacta o consumo de cerveja. Outro fator importante que impacta o consumo de cerveja é o clima. Dias quentes e sem chuva estão diretamente relacionados ao aumento do consumo.
Quanto aos desafios, quais se destacam?
Um dos desafios atuais é o impacto das apostas esportivas, que têm crescido de maneira descontrolada e comprometido o poder de compra das famílias. Isso preocupa não apenas o setor de cervejas, mas toda a sociedade brasileira. Outro ponto é a transição energética e a manutenção da frota de distribuição. Há um esforço contínuo para renovar a frota, visando emissões zero e novas tecnologias.
Sobre as pequenas cervejarias: qual o papel delas no mercado?
No Brasil, 95% do mercado de cerveja está nas mãos de três grandes empresas. As outras quase 1,9 mil pequenas cervejarias detêm menos de 5% do mercado. As pequenas empresas enfrentam muitos desafios, como questões tributárias e logísticas.
É difícil competir com grandes redes de supermercados e se manter sustentável com preços acessíveis ao consumidor. Isso reforça a necessidade de proteger e apoiar as pequenas empresas, não apenas no setor de cervejas, mas em toda a economia.
Como o setor vê a Reforma Tributária, especialmente para as pequenas cervejarias?
De um modo geral, o setor sempre defendeu a neutralidade da carga tributária no novo sistema, especialmente no que diz respeito ao imposto seletivo. No entanto, ainda estamos preocupados com a definição das alíquotas, que será feita em leis complementares a partir do próximo ano. Em relação às pequenas, preocupa. Na hora em que essa pequena cervejaria sair do Simples Nacional, fica muito complicado. Acrescenta uma subscrição tributária, tem que enfrentar incentivos fiscais e todo arcabouço regulatório do ICMS.
A logística também é muito complexa, o país é grande para caramba, né? Com essa reforma, acho que faltou aí um pequeno cuidado, ao olhar para os pequenos negócios no geral, se não pode matar muitas pequenas cervejarias. A gente precisa ter na Reforma Tributária o apoio às pequenas empresas deste país.
Em relação aos insumos, como está a situação?
Há cerca de 10 mil famílias envolvidas na produção de cevada. Isso é importante, já que no lúpulo consumido ainda importamos cerca de 99%. Essa é uma fronteira interessante a ser explorada. Como setor, estamos começando a desenvolver a produção de lúpulo no Brasil, com apoio da Embrapa, o que traz uma perspectiva promissora para a cultura agrícola.
Quanto à questão da importação e exportação de cervejas, como está o cenário?
A importação e exportação de cervejas no Brasil representa historicamente cerca de 1% da produção. O mercado interno é tão forte que a maioria dos esforços está concentrada em atender o consumidor brasileiro. Curiosamente, apesar de a China ser o maior produtor mundial de cerveja, não vemos marcas chinesas no Brasil, devido à forte presença e competência das empresas nacionais em proteger seu território.
Como o senhor vê o futuro de curto e médio prazo do setor no Brasil?
O futuro do setor depende de medidas que protejam as pequenas empresas e permitam que elas cresçam. Além disso, o setor continua a investir em inovação, transição energética e novas embalagens, sempre buscando atender um mercado consumidor cada vez mais sofisticado e exigente.
FONTE: DIÁRIO DO COMÉRCIO – POR VICTOR MARQUES