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FORA DO ENVELOPE DA REFORMA TRIBUTÁRIA, MUDANÇA DA TRIBUTAÇÃO DA RENDA JÁ COMEÇOU

11 de janeiro de 2024

Novas regras para fundos fechados, subvenções e Perse revelam esforço para onerar ainda mais essa base tributável.

Não é forçoso dizer que nos últimos anos grande parte das discussões envolvendo o direito tributário se concentrou nos exames e debates sobre a reforma tributária, que foi enfim materializada pela Emenda Constitucional 132, de 20 de dezembro de 2023.

Os debates envolvendo a então PEC 45/2019 – precursora da emenda aprovada – deixavam claro que a reforma em questão tinha como objetivo, unicamente, a reformulação da tributação sobre o consumo, o que ocorreria por meio da eliminação de tributos como ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins, substituindo-os por um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, a ser repartido entre União, estados e municípios.

Nesse contexto, o desenho normativo ali delineado indicava que, posteriormente à promulgação da já citada Emenda Constitucional, haveria o compromisso de o Poder Executivo Federal promover o início da reforma da tributação sobre a renda e sobre a folha de salários, de modo a equilibrar eventual aumento de carga tributária que o IVA dual pode vir a ocasionar.

Tanto assim o é que o artigo 18, incisos I e II, da Emenda Constitucional 132, de 20 de dezembro de 2023, previu, respectivamente, que após à promulgação da reforma, a Administração Federal teria 90 dias para encaminhar ao Congresso Nacional “projeto de lei que reforme a tributação da renda, acompanhado das correspondentes estimativas e estudos de impactos orçamentários e financeiros”, bem como “projeto de lei que reforme a tributação da folha de salários”.

Ocorre, no entanto, que de maneira concomitante à reforma tributária, no apagar das luzes da sessão legislativa correspondente ao ano de 2023, algumas mudanças significativas na tributação sobre a renda foram debatidas e promulgadas pelo Congresso Nacional, assim como sancionadas pelo presidente da República.

Primeiramente, foi promulgada a Lei 14.754, de 12 de dezembro de 2023, que permitiu a tributação pelo imposto de renda retido na fonte, à alíquota de 15% – como regra geral –, sobre os rendimentos das aplicações de fundos de investimentos fechados que operam no Brasil, a ocorrer no último dia útil dos meses de maio e novembro, ou na data da distribuição de rendimentos, da amortização ou de resgate de cotas, caso esta ocorra antes, nos termos do art. 17, incisos I e II da lei em questão.

Essa forma de tributação nada mais é do que a extensão, aos fundos fechados, da tributação sobre a renda conhecida como “come-cotas”, que já era aplicável à maioria dos fundos de investimentos cujas cotas são comercializadas no mercado aberto, exação esta que não era imponível aos fundos fechados, na esteira do art. 9º, § 4º, da Instrução Normativa 1.585/2015, da Receita Federal.

A legislação indicada, além disso, previu que os rendimentos e ganhos de capital decorrentes de capital aplicado no exterior, nas modalidades de aplicações financeiras e de lucros e dividendos de entidades controladas, serão tributadas anualmente à alíquota de 15%. Essa é a chamada tributação das offshores e trusts estabelecidos no exterior, que permite a tributação anual, pelo imposto de renda, dos rendimentos obtidos por residentes no Brasil com essas estruturas jurídicas e financeiras situadas fora das fronteiras nacionais, com vistas a impedir o diferimento do imposto de renda para o momento do resgate ou alienação das cotas.

Segundo o parecer do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o objetivo de igualar a tributação dos fundos fechados aos fundos abertos, bem como o de tributar as offshores tem por objetivo materializar a isonomia tributária, igualando a situação tributária dos investidores de fundos abertos no país com quem investe em fundos fechados e fora do país.

No mesmo contexto de oneração da tributação sobre a renda, nos últimos dias do ano que se passou, foi sancionada e publicada a Lei 14.789, de 29 de dezembro de 2023, que revogou o anterior regramento que permitia a retirada das subvenções para investimento da base de cálculo de tributos federais como o IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. O artigo 21 da lei indicada revogou os dispositivos das Leis 10.637, de 30 de dezembro de 2002; 10.833, de 29 de dezembro de 2003 e 12.973, de 13 de maio de 2014, que permitiam que as subvenções para investimento, a exemplo dos créditos presumidos de ICMS, fossem retirados das bases de cálculo dos citados tributos federais.

Essa mudança impõe que, a partir deste ano de 2024, os contribuintes que recebam subvenções para investimento deverão incluir esses valores nas bases de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. A legislação, contudo, pretendeu atenuar a oneração fiscal em questão por meio da implementação de crédito fiscal correspondente à alíquota do IRPJ (que é de 25%) sobre as receitas das subvenções para investimento.

Acontece, todavia, que mesmo com a implementação do crédito fiscal indicado, o cenário é de oneração tributária. A economia fiscal que os contribuintes beneficiários de subvenções possuíam com a retirada das subvenções para investimento das bases de cálculo de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins era de cerca de 43% sobre o valor da subvenção, pois que somadas as alíquotas dos citados tributos federais.

A Lei 14.789, de 29 de dezembro de 2023, também, restringiu o modo de dedução dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) do lucro real, que serve de base de cálculo para o IRPJ e para a CSLL, dispondo, por exemplo, que para fins de contabilização do JCP a ser deduzido do lucro real apenas serão considerados, a partir de agora, o capital social integralizado, as reservas de capital destinadas ao ágio na emissão de ações e as reservas de lucros sem considerar as reservas de lucros destinadas aos incentivos fiscais.

Essas alterações legislativas, portanto, conduzem ao cenário de intensificação da tributação sobre a renda, sem se esquecer da Medida Provisória 1202, de 28 de dezembro de 2023, que gradualmente acaba com os benefícios fiscais estabelecidos pelo Perse a partir de 1º de abril de 2024 e pretende promover o aumento da tributação sobre a folha de pagamentos para as empresas que optavam pelo pagamento da CPRB em substituição aos impostos sobre a folha.

Sobre esse último assunto, é relevante destacar que o Congresso Nacional deverá, a partir do próximo dia 2 de fevereiro – data em que se encerra o seu recesso – analisar rapidamente tal medida provisória, sob pena de se chegar ao dia 1º de abril e os contribuintes que gozam do benefício fiscal do Perse terem que voltar a pagar tributos como CSLL, PIS e Cofins.

É dizer, então, que a reforma da tributação sobre a renda já se iniciou, mesmo antes do que previsto no artigo 18 da EC 132 e se coloca no sentido de onerar ainda mais essa base tributável.

Do ponto de vista de justiça fiscal, eficiência e neutralidade do sistema tributário, a tributação sobre a renda é sempre preferível sobre a tributação sobre o consumo. Resta saber, contudo, se a impactante oneração pretendida será compensada com o estabelecimento de alíquotas razoáveis e menores que as esperadas para o IVA estabelecido com a reforma.

FONTE: JOTA – POR ANDRÉ MARINHO MEDEIROS SOARES DE SOUSA e JERÔNIMO DIX-NEUF ROSADO DOS SANTOS

 

 

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