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TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL

9 de junho de 2022

A transação tributária para empresas em recuperação judicial não deveria se limitar ao momento de homologação.

A Lei do Contribuinte Legal (nº 13.988/2020) trouxe avanços na relação Fisco-contribuinte ao prever a transação de créditos federais de natureza tributária ou não, inclusive de autarquias e fundações federais. Realizada junto à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a transação tem como pressuposto o grau de recuperabilidade do crédito, cuja presunção é de irrecuperabilidade para as empresas em recuperação judicial, com descontos mais atrativos.

Tais reduções chegam em boa hora, concomitantemente às alterações promovidas pela Lei nº 14.112/20 à Lei nº 11.101/05, que, por exemplo, autorizou aproveitamento integral de prejuízo fiscal e de base negativa para abater o Imposto de Renda (IRPJ) e a CSLL decorrentes do ganho de capital na alienação judicial de ativos, ressalvadas as operações com pessoas controladas, coligadas, interligadas, sócias ou administradoras.

A transação tributária para empresas em recuperação judicial não deveria se limitar ao momento de homologação.

Essas mudanças trouxeram maior compatibilidade fática entre o Direito e os obstáculos enfrentados pelas empresas em recuperação judicial. Antes, a efetividade do processo era mitigada pelo ônus fiscal e pelas restritas opções de pagamento da dívida. Agora, além da efetiva negociação e dos maiores descontos, há prazo de pagamento estendido. Os descontos podem atingir 70% do valor da dívida, com pagamento em até 120 meses. Nos casos de microempresa, EPP, empresário individual, Santas Casas de Misericórdia, instituições de ensino, sociedades cooperativas e demais organizações da sociedade civil, sobe para 145 meses.

Nem tudo parece agradar. A Lei nº 14.112/20, além de alterar a Lei nº 11.101/05, trouxe alterações para a Lei nº 10.522/02, que fixa hipóteses de pagamento de créditos junto à PGFN. O artigo 10-C trouxe delimitação temporal ao pedido de transação tributária para que empresas sujeitas à recuperação judicial possam negociar descontos mais vantajosos. O termo inicial previsto no artigo é o deferimento do processamento da recuperação, e o termo final é o de apresentar a certidão de regularidade fiscal.

A orientação da PGFN para os contribuintes sujeitos à recuperação judicial é de que a transação individual somente pode ser concedida entre o deferimento do processamento da recuperação judicial e o momento imediatamente anterior à concessão do plano, o qual consiste no momento de comprovação da regularidade fiscal. Isso nos leva à falsa conclusão de que qualquer empresa em recuperação possa se beneficiar de condições mais vantajosas, afinal, o plano não poderia ser homologado sem a apresentação da certidão.

Na prática, é quase inviável uma empresa recuperanda dispor da CND ou CPEN, o que leva os juízos a homologarem planos de pagamento antes mesmo de expedida a certidão, ou a dispensá-la, o que tem sido cada vez mais difícil ante os precedentes firmados. Muitas vezes, essa é a solução cabível, dado o impacto do passivo fiscal no patrimônio, em atenção ao princípio da preservação da empresa e da prioridade de pagamento das dívidas trabalhistas, por exemplo.

É questionável a absoluta vinculação de condições vantajosas ao momento imediatamente anterior à homologação do plano, pois a exigência da certidão de regularidade fiscal pode ser dispensada ou postergada pelo juízo da recuperação. Se uma empresa se enquadrou nessa hipótese e teve seu plano homologado, teoricamente não será beneficiada pelas melhores condições, revelando tratamento tributário diferenciado para contribuintes em situação equivalente.

E se uma empresa teve plano homologado e depois suspenso por ausência de certidão de regularidade fiscal ou por qualquer outro motivo? Na primeira hipótese, entendemos que a verdade material – inerente à esfera tributária e, logo, por que não à transação? – implica na não homologação efetiva do plano.

Aqui, deixamos a crítica de que a transação tributária para empresas em recuperação judicial não deveria se limitar ao momento de homologação, dadas as diversas circunstâncias que fragilizam o marco como definidor das condições mais proveitosas, desacreditando sua finalidade e importância.

Uma alternativa seria vincular os descontos ao momento de apresentação da certidão de regularidade fiscal. Solução essa encontrada pela Lei nº 14.112/20 ao inserir na Lei nº 10.522/20 o artigo 10-C, que em momento algum fixa a homologação como termo final da proposta de transação, mas sim até o momento de apresentar a certidão, independentemente da homologação do plano.

O tratamento ideal, adequado aos princípios inerentes à recuperação, é examinar casuisticamente a situação da empresa e o andamento da recuperação, seja antes ou depois da homologação ou da apresentação da certidão. Vedar a possibilidade de diálogo e verificação concreta da empresa para concessão de descontos mais vantajosos parecem contrários à finalidade, tanto da recuperação judicial quanto da transação tributária.

FONTE: Valor Econômico – Por Eduardo Muniz e Tereza Amorim

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