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RASTREIO DE CADEIAS PRODUTIVAS PELA RECEITA E DIREITOS DO CONTRIBUINTE

9 de junho de 2022

Em 12 de abril de 2022 foi publicada, no Diário Oficial da União, a Portaria nº 165, por meio da qual foi instituído o Programa Brasileiro de Rastreabilidade Fiscal (Rota Brasil).

O programa criado nasceu com a intenção de padronizar os controles sistêmicos de produção e rastreabilidade de produtos, que se dará, principalmente, pela utilização de selos digitais (estampas impressas), contendo um identificador único (UI), com informações básicas de produção e pela integração com o Sistema de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e).

Apesar de já estar em vigor desde a data de sua publicação, a aplicação do programa dependerá, ainda, de atos complementares advindos da Receita Federal.

É importante mencionar que a sua adoção deverá ser realizada, obrigatoriamente, por fabricantes e importadores de produtos controlados, ou seja, produtos mencionados nos artigos 27 a 30 da Lei nº 11.488, que são cigarros classificados na posição 2402.20.00 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (Tipi), e os do artigo 35 da Lei nº 13.097, quais sejam, bebidas diversas.

Mesmo que a obrigatoriedade seja somente para fabricantes e importadores dos produtos acima mencionados, outros produtores também poderão, de maneira voluntária, aderir ao Programa Rota Brasil.

Por meio desse programa, será possível a identificação da origem de produtos e o seu acompanhamento na cadeia produtiva.

Depreende-se, portanto, que a principal consequência da implantação do programa estará na possibilidade de que tanto o fabricante que o tenha aderido, quanto o consumidor final, tenham a certeza da autenticidade dos produtos que tenham consigo, combatendo, dessa forma, falsificações e piratarias.

Inclusive, é necessário esclarecer que o consumidor final foi mencionado no parágrafo anterior em razão de o programa prever a possibilidade de que eles tenham acesso a informações que deem a eles a certeza da veracidade dos produtos.

Apesar de ainda estar no início, espera-se que o programa em questão não somente auxilie com as situações ditas acima, mas também proteja a livre concorrência de mercado, além da saúde dos consumidores, uma vez que produtos falsificados não passam pelos mesmos testes de padrão de qualidade que os autênticos, por exemplo.

Espera-se, também, considerável melhora no controle logístico das empresas adeptas do programa, de modo a possibilitar, inclusive, uma evolução na qualidade do diálogo existente entre Fisco e contribuintes, já que tal padronização trará mais controle à produção e, consequentemente, a apuração dos tributos.

Independentemente do nível de aderência do mercado local ao Rota Brasil, o programa não pode, de modo algum, enfraquecer a livre iniciativa, pois esta é um valor fundamental do Estado brasileiro (artigo 1º, IV, da Constituição). Isso nos leva a uma leitura atenta da portaria quando se põem os objetivos do programa, dentre os quais estão a “repressão da importação e produção ilegais e da comercialização de contrafações” (artigo 1º, parágrafo único, da Portaria RFB nº 165/2022).

Uma primeira necessidade para tal leitura atenta é a de que a portaria está regulamentando uma atividade de autoridades fiscais com poder de polícia, isto é, de repressão, com acesso a informações fiscais sensíveis, pois o rastreio feito pelo Rota Brasil pressupõe integração com o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), e, dentro dele, com o módulo de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e).

A segunda necessidade de atenção à capacidade de rastreio é a de que outros setores poderão ser incluídos no Rota Brasil de forma obrigatória, pois a Portaria RFB nº 165/2022 nesse ponto faz uma remissão a uma legislação bastante antiga, isto é, ao artigo 46 da Lei nº 4.502/1964.

Aqui, há um problema de ordem regulamentar, provavelmente originado pelo anacronismo da referência, pois uma lei editada em 1964 diz respeito a um contexto muito diferente ao de uma portaria editada em 2022. Na prática, o poder conferido pela citada lei se refere a sistemas de rotulagem, etiquetagem, numeração ou aplicação de selos em mercadorias, o que é algo distinto dos objetivos da Portaria RFB nº 165/2022 (Rota Brasil).

Por outro lado, a iniciativa do Rota Brasil pode ser uma porta de entrada para certificação de cadeias produtivas em um momento em que os mercados, em nível global, estão cada vez mais demonstrando interesse em definir, de forma segura, os impactos sociais e ambientais das respectivas cadeias produtivas.

Portanto, os atos a serem praticados pelas autoridades envolvidas na implantação do Rota Brasil devem ser observados com atenção. Não somente a execução do que dispõe a Portaria RFB nº 165/2022, mas, principalmente, o que será praticado a partir dela e/ou com base nela.

FONTE: Conjur – Por João Amadeus Santos e Thais Karoline Medeiros

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