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ISS E AS ATIVIDADES DE SELF STORAGE

24 de maio de 2022

Não há que se falar em qualquer prestação de serviço, mas, quando muito, mera cessão não sujeita à incidência do ISS.

A instalação de depósitos para autoarmazenamento ou self storage têm se disseminado no Brasil e, embora seja um mercado pouco explorado, já suscita diversos questionamentos, especialmente no que diz respeito ao Imposto sobre Serviços (ISS).

Como cediço, a Constituição Federal autoriza os municípios a tributar serviços de qualquer natureza, desde que definidos em lei complementar (artigo 156, III, CF). Exatamente por isso, o Supremo Tribunal Federal (STF), quando do julgamento do Tema nº 296 de repercussão geral, consagrou o entendimento no sentido de que a lista de serviços veiculada pela Lei Complementar nº 116/03 é taxativa, admitindo-se a interpretação extensiva apenas para abranger atividades congêneres aos serviços lá mencionados.

Não há que se falar em qualquer prestação de serviço, mas, quando muito, mera cessão não sujeita à incidência do ISS.

De fato, ao referir-se à “interpretação extensiva”, a Corte deixou claro que o fez para evitar que eventual redação da lista de serviços exclua da órbita de tributação pelo ISS as prestações “inerentes aos serviços elencados em lei”, é dizer, atividades congêneres a serviços listados que, por uma questão de mera nomenclatura, destes pareçam se dissociar. O precedente não autoriza, portanto, o emprego de analogia – vedada, aliás, pelo artigo 108, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional (CTN) – para justificar a tributação de atividades que não guardem correspondência material aos serviços listados.

Há que se ponderar, ainda, que se os institutos de direito privado utilizados pela Carta Magna para definir competências não se podem perverter para artificial incremento das materialidades tributáveis (artigo 110, CTN), tampouco se pode admitir que assim se proceda ao interpretar as disposições da lei tributária.

Bem fixadas tais premissas, deve-se registrar que o subitem 11.04 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03 apenas autoriza incidência do ISS sobre serviços de “armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda de bens de qualquer espécie”.

O contrato de depósito – que também abrange as modalidades de guarda – é regido pelo Direito Civil (artigo 627 a 646, CC) e pressupõe: (i) a transmissão da posse do bem depositado; (ii) a responsabilidade do depositário pela integridade do bem em decorrência do dever de custódia (artigo 629 do CC); e (iii) o animus de recebimento da coisa.

O contrato de armazenagem, por seu turno, encontra disciplina específica no Decreto nº 1.102/03, mas, por se tratar de modalidade de depósito – mais especificamente, depósito mercantil – pressupõe, também, a tradição da coisa, o dever de custódia dos bens armazenados etc.

Em ambos os casos, portanto, vê-se que a atividade contratada tem como objeto os bens a serem guardados e, exatamente por isso, se perfaz apenas com a entrega da coisa, estando a contraprestação devida ao depositário atrelada a este fato.

Ao examinar as atividades realizadas pelas empresas de self storage, contudo, verifica-se que o seu objeto não são os bens de propriedade do cliente, mas sim o local onde esses bens podem ser guardados.

Essas contratações, como regra, envolvem unicamente a disponibilização de espaços para a acomodação de bens diversos, sendo irrelevante para a sua concretização se o cliente utiliza ou não o local para a guarda de itens de qualquer natureza.

Embora as empresas realizem atividades de monitoramento, limpeza e manutenção das áreas comuns, trata-se, evidentemente, de ações destinadas a preservação dos locais destinados ao armazenamento, não, propriamente, dos bens que eventualmente venham a ser guardados. Tanto que serão realizadas mesmo se não existirem contratos ativos ou se os clientes não utilizarem efetivamente os espaços disponibilizados.

Além disso, observa-se que essas pessoas jurídicas não realizam qualquer controle sobre os bens porventura armazenados, nem se responsabilizam pela sua conservação, manutenção, guarda e retirada, reforçando a conclusão no sentido de que a contratação se volta para o local da armazenagem, não para os bens a serem guardados. Não há, pois, como incluí-las dentre as atividades de armazenamento, depósito e guarda de bens a que alude o subitem 11.04 da Lista de Serviços.

Por fim, no que diz respeito à carga, descarga e arrumação, estas também não se verificam nessa hipótese. Ainda que sejam oferecidos carrinhos e/ou outros elementos para facilitar o transporte de bens, nota-se que as atividades de carga, descarga e arrumação nos espaços disponibilizados são realizadas exclusivamente pelos clientes, por sua própria conta e risco (autogestão). Não há, pois, que se falar em qualquer prestação, mas, quando muito, mera cessão não sujeita à incidência do ISS.

Diante do exposto, e considerando o núcleo dos contratos de self storage, não há como qualificar tais atividades como prestação de serviços de depósito, armazenagem, carga, descarga ou guarda de bens quaisquer e, portanto, admitir a cobrança do ISS nessas hipóteses.

FONTE: Valor Econômico – Por Marina V. de Figueiredo e Fabio Lemos Cury

 

 

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