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MASSA FALIDA DO CRUZEIRO DO SUL PAGA R$ 717 MILHÕES À UNIÃO

15 de fevereiro de 2022

Depuração e revisão de débitos poderão ser replicadas a outras falências, recuperações judiciais e empresas em geral.

O Banco Cruzeiro do Sul pode estar prestes a pagar R$ 1,4 bilhão aos 3.145 credores quirografários no seu processo de falência. A maioria é formada por bondholders – donos de títulos de débito da instituição financeira. A quitação poderá ocorrer porque a massa falida do banco pagou sua dívida em impostos com a União, um total de R$ 717 milhões, o que destravou o processo

O caso é considerado emblemático. Isso porque seu resultado é fruto do trabalho da massa falida, credores, juiz da causa, Receita Federal e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). E poderá ser replicado a outras falências, recuperações judiciais e empresas em geral com débitos tributários em aberto.

Não houve transação ou a aplicação do chamado negócio jurídico processual, ferramentas que permitem a negociação de valores. “Foi um caso de diálogo, com gestores da massa falida buscando a conformidade fiscal não litigiosa”, afirma Mariana Lellis Vieira, procuradora regional da Fazenda Nacional na 3ª Região (SP). “Um conceito muito relevante porque mostra a nova postura que a Fazenda quer levar a outros casos”, acrescenta.

Na prática, esse novo conceito é simples. Segundo a procuradora, a Fazenda Nacional entra em contato com o administrador judicial da massa falida ou recuperação judicial, por exemplo, estudam juntos como está composto o passivo e é feita uma revisão das dívidas, chamada tecnicamente de “depuração”.

No caso concreto, o passivo da massa falida do Cruzeiro do Sul cresceu muito nos últimos anos. Um processo judicial específico dobrou sua dívida de R$ 1,5 bilhão para R$ 3 bilhões. A causa era a adesão da massa ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) e ao Programa de Regularização Tributária (PRT).

Os programas permitiram o pagamento de débitos tributários em condições especiais. Possibilitaram o uso de prejuízo fiscal e créditos de terceiros, por exemplo. Contudo, a Fazenda barrava a aplicação pelo fato de o contribuinte ser massa falida.

“Quando estudamos a fundo, entendemos que poderia ter havido uma falha de comunicação, porque a massa falida poderia aderir à modalidade do Pert/PRT por meio do pagamento à vista”, diz Mariana. “Além disso, foram encontrados Darfs [Documento de Arrecadação de Receitas Federais] pagos, soltos no sistema da Receita Federal, por problema no preenchimento, o que foi corrigido”, completa.

Também chama a atenção a aplicação da Taxa Referencial (TR) para a correção dos valores. A procuradora explica que “foram usadas as regras do cálculo falimentar, com o juros Selic até o momento da liquidação e, depois, o saldo é corrigido pela TR”.

Procurada pelo Valor, a Laspro Consultores, administradora da massa falida do banco, confirma o acerto com a União e que pagará os credores quirografários.

Esse trabalho de revisão dos débitos é importante, especialmente, para o contribuinte em processo de falência ou recuperação judicial porque é preciso, primeiro, provisionar o dinheiro para quitar os débitos tributários para, só depois – conforme a ordem estabelecida pela Lei nº 11.101, de 2005, a Lei das Recuperação Judicial e Falência -, pagar os credores quirografários. “No caso do Cruzeiro do Sul, o que restou em aberto são só rúbricas após os credores quirografários”, afirma Mariana.

Primeiro, a massa falida do Cruzeiro do Sul havia tentado a transação tributária. Mariana chama a atenção para o fato de o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) ter consolidado que o fato de a empresa estar falida não garante o direito ao desconto da transação (processo nº 2004388-77.2021.8.26.0000).

“Se há capacidade de pagamento pelo contribuinte, não há direito aos descontos da transação. Mas pode ser aberto um diálogo para a depuração e revisão dos débitos”, diz a procuradora.

O advogado Julio Mandel, sócio do Mandel Advocacia, lembra que antigamente o processo de falência não andava, não tinha fim, porque o Fisco não era pago ou se demorava para pagar. “O Fisco não negociar é contraproducente para o Judiciário. Num diálogo com toda transparência, se todo mundo concorda, pode ser possível chegar a um denominador comum”, afirma.

O maior benefício dessa postura da Fazenda Nacional, para Mandel, é chegar rápido ao encerramento do processo de falência para a reabilitação célere do falido. “Espero que o mesmo funcione para os processos de recuperação judicial.”

FONTE: Valor Econômico – Por Laura Ignácio — De São Paulo

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