Caso chegou ao conselho depois que o contribuinte foi alvo de fiscalização para apurar a prática de fraudes no comércio.
Os conselheiros da 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) começaram a analisar processo que discute a possibilidade de uso de provas consideradas ilícitas por decisão judicial no processo administrativo fiscal. O placar estava em 2×0 a favor do recurso da Fazenda Nacional, que pleiteava o uso das provas, quando a conselheira Tatiana Midori Migyima pediu vista.
O caso chegou ao Carf depois que o contribuinte foi alvo de fiscalização para apurar a prática de fraudes no comércio exterior em conluio com a empresa Borgtec Indústria e Comércio Ltda. A Receita lavrou auto de infração para cobrança de Imposto de Importação, IPI, PIS e Cofins.
O fisco agiu em decorrência de investigação conjunta da Receita Federal e da Polícia Federal no âmbito da Operação Dilúvio. Segundo a fiscalização, a Borgtec importava os produtos de maneira irregular e fraudulenta e os entregava à Cil, considerada a real adquirente, e que permanecia oculta durante toda a transação. A empresa, então, consumia ou entregava a compradores as mercadorias que, segundo a Receita, sabia serem importadas irregularmente.
Na 3ª Turma da Câmara Superior, a procuradora Maria Concília de Aragão Bastos, representante da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), afirmou que as provas deveriam ser admitidas à luz da teoria da descoberta inevitável e da teoria da fonte independente. Segundo ela, as provas derivadas de provas ilícitas devem ser consideradas lícitas se comprovado que teriam sido obtidas de qualquer forma ou se obtidas por meio de fonte independente.
“Se a prova que decorre da ilícita seria obtida por atos de investigação válidos, poderia ser aproveitada e isso eliminaria a contaminação. O Estado pode se aproveitar, principalmente o fisco, uma vez que a autoridade fiscal tem poder de polícia, o que garante acesso a arquivos fiscais, a livros, a documentos, no intuito de verificar o cumprimento de obrigações tributárias”, afirmou a procuradora.
Escutas telefônicas
Porém, a advogada Fernanda Foizer, representante do contribuinte, afirmou que, no caso específico do contribuinte, não seria possível obter as provas por outro meio que não as escutas telefônicas da Operação Dilúvio, consideradas ilícitas na esfera judicial.
“A Cil só entrou nesse processo por conta das escutas telefônicas. Inclusive, nem era responsável pelo recolhimento desses impostos. Portanto, não teria como apresentar documentação para que essas provas pudessem ser colhidas de outras formas”, disse.
O relator, conselheiro Rodrigo Pôssas, votou a favor do recurso da Fazenda nos termos do acórdão 2401004578, trazido como paradigma, que admitiu o uso das provas com base na teoria da descoberta inevitável e da teoria da fonte independente.
Ele foi acompanhado pelo conselheiro Luiz Eduardo de Oliveira Santos e, em seguida, a conselheira Tatiana Midori Migyiama pediu vista.
A julgadora entendeu ser necessário analisar o tema à luz da lei 13.869/2019, a Lei de Abuso de Autoridade. A norma prevê, em seu artigo 25, que o agente público que faz uso da prova ciente de sua ilicitude está sujeito à pena de detenção de um a quatro anos e multa. À época da decisão da turma baixa, que considerou imprestáveis as provas que fundamentaram o auto de infração, a lei ainda não estava em vigor.
O número do processo é 19647.003588/2010-66.
FONTE: JOTA – Por Mariana Branco