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SETORES ECONÔMICOS PREPARAM CONTRA-ATAQUE AO PROJETO DE REFORMA DO IR

6 de julho de 2021

Setores que alegam que a proposta aumenta a carga tributária estão elaborando estudos e emendas ao projeto

 Diversos setores econômicos estão se posicionando contra o projeto de reforma do Imposto de Renda proposto pelo governo federal no dia 25 de junho. De uma forma geral, setores consultados pelo JOTA analisam que o PL 2337/2021 resultará em aumento de carga tributária para a pessoa jurídica, e que a redução da atual alíquota de 15% de IRPJ para 10% a partir de 2023 não será suficiente para compensar as novas cobranças, como a tributação de 20% sobre os dividendos, hoje isentos, e o fim da possibilidade de dedução dos valores de Juros Sobre Capital Próprio (JCP).

Associações empresariais afirmam ainda que como o adicional de 10% para lucros acima de R$ 20 mil por mês será mantido, a atual alíquota média de 34%, contando a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), pode chegar a 49% com as alterações. Por isso, iniciou-se um intenso movimento para o convencimento dos parlamentares sobre os reais impactos da reforma. Setores mais organizados estão, por exemplo, elaborando estudos de cenários e correndo contra o tempo para propor emendas e articular mudanças no texto durante a tramitação no Congresso.

O ministro Paulo Guedes e outros representantes do governo federal vêm afirmando em entrevistas, coletivas de imprensa e a grupos de empresários que têm pressa na aprovação do projeto do IR. Parte da preocupação é justificada pela ciência de que a extensa pauta de votações no Legislativo conta com temas inevitáveis para a classe política, com as mudanças em regras eleitorais válidas para 2022 e o debate em torno do Orçamento e do novo programa social do governo.

Também busca-se evitar que o projeto ande a passos lentos, como ocorre com a proposta da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Outro elemento importante para pressão é o fato de o projeto do Imposto de Renda garantir o cumprimento da promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro de aumentar a faixa de isenção da pessoa física.

Infraestrutura e indústria

Setores de infraestrutura, como energia elétrica e telecomunicações, sustentam que o aumento da carga tributária vai impactar nos preços e nos investimentos em infraestrutura. Tanto no setor de telecomunicações como na distribuição de energia, a maioria das empresas é tributada no Lucro Real, distribui dividendos aos acionistas e deduz valores de Juros Sobre Capital Próprio (JCP).

Segundo a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), a alíquota efetiva média do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) deve subir de 33% para 43%, em uma conta inicial, sem levar em consideração variáveis contábeis e financeiras. Representantes das distribuidoras acreditam que a diferença será repassada ao consumidor quando houver revisão tarifária – como o setor é regulado, as tarifas só podem ser modificadas a cada ano e com a participação da agência reguladora. A Abradee prevê ainda um efeito em cadeia também em outros produtos, já que a energia elétrica é insumo para outros setores, como a indústria.

“A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) tem a política de todos os países desenvolvidos terem tributação sobre dividendos. Isso é verdade. Ninguém defende não tributar dividendos, mas não em qualquer situação. Em um setor de infraestrutura como é o nosso, o reinvestimento é parte do negócio”, afirma Wagner Ferreira, diretor jurídico e institucional da Abradee. “Em um contrato de 30 anos, a empresa reinveste muito no início para ter o resultado no final. Assim, se a empresa vai reinvestir, não faz sentido ter tributação sobre a parcela reinvestida”, complementa.

O Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviços Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil) calcula que, caso a reforma no Imposto de Renda seja aprovada conforme o texto inicial, a alíquota nominal sairá de 34% para 49% – contando com a alíquota da CSLL. O Sinditelebrasil está preparando um estudo específico sobre o setor de telecomunicações para mostrar aos parlamentares que o PL do Executivo pode encarecer o serviço no Brasil e prejudicar investimentos.

A reforma proposta desestimula investimentos, aumenta carga tributária e tem implicação direta para o consumidor, principalmente aquele que precisa de internet. Por isso, nós assumimos um posicionamento contrário a essa segunda fase. Vamos dialogar com o governo e com os parlamentares”, afirma Marcos Ferrari, presidente executivo do Sinditelebrasil.

A indústria espera por aumento na carga tributária e na burocracia. A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) afirma que a proposta do governo traz de volta a obrigatoriedade de manutenção de contabilidade para empresas de Lucro Presumido, que havia sido dispensada anteriormente. “O governo quer um projeto de simplificação ou de complicação?”, questiona Hélcio Honda, diretor titular do departamento jurídico da Fiesp.

Honda também defende que o fim da dedução do JCP só pode ocorrer se o governo voltar com a correção monetária do balanço, que era uma remuneração das contas do patrimônio líquido da empresa, entre elas, a conta do capital que o acionista colocava na companhia.

Forte impacto no setor imobiliário

Segundo especialistas consultados pelo JOTA, os setores imobiliário, de franquias e de licenciamento artístico e esportivo serão prejudicados pela 2ª fase da reforma tributária, devido à previsão de que empresas com mais de 50% da receita bruta decorrente de royalties, licenciamento ou de administração, aluguel ou compra e venda de imóveis próprios passarão ao regime do Lucro Real. Setores como shopping centers também poderão sentir aumento de carga tributária.

Essas empresas estão atualmente no Lucro Presumido, por meio do qual o total a pagar de IRPJ e CSLL é calculado após a aplicação de um percentual de presunção. O Lucro Real, além de mais complexo, costuma ter alíquotas maiores.

Além disso, empresas no Lucro Real estão automaticamente no regime não-cumulativo de PIS e Cofins, com alíquotas superiores em relação às da cumulatividade. O grande benefício da não-cumulatividade é a possibilidade de aproveitamento de créditos, porém as companhias do ramo imobiliário, segundo especialistas, não verão grandes vantagens no creditamento.

De acordo com tributaristas, as atividades do setor imobiliário não costumam gerar créditos. Não há uma cadeia longa de produção ou aquisição frequente de insumos, que poderiam dar direito ao creditamento. “Dada a natureza que essas empresas desenvolvem, poucos créditos se enquadrariam entre as hipóteses que a legislação prevê como apropriação de créditos”, define o advogado Rodrigo Pará, do Mattos Filho Advogados.

“A empresa trocaria uma carga de 14,53% no Lucro Presumido por uma carga combinada que pode chegar a 48,5%, se considerar 29% de IRPJ e CSLL, 20% de dividendos e PIS e Cofins a 9,25% na não-cumulatividade”, complementou Pará.

O advogado Luiz Gustavo Bichara, do Bichara Advogados, lembra ainda que os shoppings passaram por dificuldades em decorrência da pandemia. Para ele, em caso de constatação de que a tributação não estava condizente à realidade do setor o governo poderia ter optado por ajustar o percentual de presunção no Lucro Presumido. “O que não dá é expulsar contribuintes para o Lucro Real”, diz.

Companhias abertas trabalham em emendas

A Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) trabalha na produção de cerca de 28 emendas ao PL 2337/2021. O grupo entende que a proposta do governo precisa de uma sistemática que não gere aumento da carga tributária. Preocupa a associação a alíquota de 20% sobre o dividendo na fonte, por entender que a tributação pode afastar o investidor. Além disso, a entidade defende a adoção de um regime de consolidação fiscal, acabando com o “efeito cascata” a partir da tributação de várias empresas ligadas entre si.

Outro ponto que deixa o setor em alerta é a tributação conforme o ano em que o resultado é gerado, motivo pelo qual a Abrasca vai propor a segregação dos resultados. “Os lucros da empresa até dezembro de 2021, quando forem distribuídos, não podem sofrer a retenção do dividendo na fonte. Isso deve valer para frente. Ou, de acordo com o PL, o lucro que já foi tributado a 34% sofrerá incidência de mais 20%”, diz Luis Henrique Guimarães, presidente do conselho diretor da associação.

Saúde prevê aumento de preços, mas CBS ainda é a maior vilã

A primeira estimativa realizada pela Confederação Nacional da Saúde (CNSaúde) prevê aumento de preços de 2,2% nos serviços médico-hospitalares caso a reforma do Imposto de Renda seja aprovada conforme o texto proposto pelo Executivo. Segundo a CNSaúde, o impacto nos hospitais e estabelecimentos de saúde será ainda maior devido à contratação de pessoas jurídicas, uma vez que, como elas terão que passar a pagar tributos sobre os dividendos, elas subirão os preços dos contratos.

“Embora tenha a redução do IRPJ, ainda tem o impacto positivo importante de aumento de custos porque muitos profissionais do setor são pessoas jurídicas, como, por exemplo, consultores e médicos pagos por pessoa jurídica. Esses profissionais vão repassar os preços”, explica Bruno Sobral, diretor-executivo do CNSaúde.

No entanto, para o setor, a criação da CBS ainda é uma preocupação maior. A CNSaúde calcula que o aumento de preço por conta da alíquota de 12% da CBS será de 7,4% para hospitais e clínicas. Para planos de saúde será de 5,2%. O setor estima prejuízo de R$ 4,6 bilhões anuais decorrentes da redução de demanda com o aumento de preços causados pela CBS.

Profissionais liberais se manifestam

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) divulgou, na última terça-feira (29/6), uma nota contrária à tributação dos dividendos conforme o previsto na reforma do Imposto de Renda proposta pelo Executivo. A entidade afirma ainda que, se não for possível manter a isenção dos dividendos no país, que ao menos seja excepcionada para os profissionais liberais organizados em forma de pessoa jurídica, como é o caso dos advogados.

Agro pode vivenciar “volta” de pessoas físicas

Especialistas em agronegócios consultados pelo JOTA apontam que o PL apresentado pelo Executivo não mexe em institutos importantes para o setor, como os Fundos de Investimentos das Cadeias Agroindustriais (Fiagro), os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) ou as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs). Mesmo assim, a tributação dos dividendos poderá afetar a cadeia do agro.

O advogado Fábio Calcini, do Brasil Salomão e Matthes Advocacia, aponta outro efeito do PL, de acordo com o texto atual: “existe um movimento que surgiu há um bom tempo que é a profissionalização do setor do agro. Existem muitas famílias que têm constituído pessoas jurídicas, holdings, agropecuárias, para migrar a sua atuação, com objetivo de melhorar a gestão, melhorar controle, de sucessão”.

Segundo o tributarista, o aumento da tributação corporativa pode fazer com que o movimento deixe de acontecer ou mesmo que haja a opção de volta à pessoa física.

FONTE: JOTA

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