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ANTIGAS MEDIDAS ECONÔMICAS AINDA OCUPAM A PAUTA DO STJ

3 de abril de 2019

Relatora do caso do Instituto Brasileiro do Café (IBC), a ministra Regina Helena Costa foi a única, até agora, a proferir voto, que foi contrário ao recurso da União.

Decisões do governo federal de duas ou três décadas atrás ainda provocam discussões acirradas no Judiciário. Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, analisaram nas últimas semanas ao menos dois casos envolvendo autarquias que hoje nem existem mais. Ambos tratam de pedidos de indenização de valores altíssimos em razão de medidas econômicas que foram tomadas no século passado.

Um desses casos envolve o pagamento de cerca de R$ 2,3 bilhões, pela União, a dez empresas exportadoras. Trata-se de uma “herança” deixada pelo antigo Instituto Brasileiro do Café (IBC).

Já se passaram mais de três décadas do fato que deu origem a essa discussão. O ano era 1986 – antes mesmo de o STJ ser criado. O tribunal, que nasceu com a Constituição Federal, completa 30 anos no próximo domingo.

Também datada dos anos 80 e início da década de 90, uma outra discussão, envolvendo o extinto Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), tem previsão de impacto ainda maior aos cofres públicos. A União pode ter que desembolsar até R$ 30 bilhões para um grupo de usinas que se dizem prejudicadas por planos econômicos que acarretaram o congelamento das tarifas do açúcar e do álcool naquela época.

Os dois processos começaram a ser julgados pelo STJ em março e foram suspensos por pedidos de vista. Não há, portanto, data prevista para que tenham um ponto final.

O caso envolvendo o IBC passou pela primeira e segunda instâncias do Rio de Janeiro e, em 2013, chegou à Corte. No mês passado, seis anos depois, foi colocado na pauta da 1ª Turma. A relatora, ministra Regina Helena Costa, foi a única, até agora, a proferir voto. Ela se posicionou contra o recurso da União que pede o cancelamento da indenização. Em seguida o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Gurgel de Faria (REsp 1.365.600).

A briga entre as exportadoras e a União envolve o que, nos anos 80, ficou conhecido como Operação Patrícia. As empresas afirmam que foram contratadas para comprar uma grande quantidade de café do tipo robusta na bolsa de Londres. A intenção era a de que com a escassez do produto no mercado, o preço do café subiria e favoreceria o país. Na época, essa commodity representava 25% da balança comercial brasileira.

Havia ficado definido, entre o IBC e as exportadoras, que o café adquirido na bolsa de Londres seria substituído pelo produto do tipo arábica, produzido no Brasil. Caso isso não ocorresse, o governo ressarciria as empresas pelos custos da operação. A discussão sobre esse prejuízo foi o que virou o século e, hoje, depende de decisão da Justiça.

Na 2ª Turma tramita o processo envolvendo o Instituto do Açúcar e do Álcool, extinto nos anos 90 por um decreto do então presidente Fernando Collor de Mello. Os ministros começaram o julgamento que definirá o modo de apuração dos valores devidos pela União à usina Agro Industrial Tabu (REsp 1.342.323).

União e empresas travaram uma batalha em razão da interferência do antigo IAA no mercado. A União era quem administrava, por meio do instituto, os preços de venda e os custos das empresas e, segundo consta no processo, fixou, durante um período, preço de venda mais baixo que o valor do custo. Vem daí o prejuízo.

As usinas já venceram essa disputa em 2013. Em recurso repetitivo, a 1ª Seção do STJ reconheceu que elas tiveram perdas com a medida. Os ministros exigiram, no entanto, que apresentassem, por meio de balanços contábeis, as comprovações dos danos.

O que se discute agora, então, é quanto deve ser pago para cada uma das prejudicadas. Os processos de execução do grupo Agroindustrial Tabu, por exemplo, que estão na pauta, foram desmembrados e cada empresa faz o seu pedido em uma ação diferente. O total, em 27 ações, pode chegar a R$ 30 bilhões. E elas não são as únicas. Há cerca de 300 ações sobre esse mesmo tema, diz Emiliana Alves, que atua nos casos pela Advocacia-Geral da União (AGU).

Se levar em conta a origem do fato, os casos das duas autarquias extintas não são nem os mais antigos em tramitação no STJ. Um outro, por exemplo, à espera de julgamento da 1ª Seção, remete aos anos 60. Trata-se dos empréstimos compulsórios da Eletrobras.

Criada com a finalidade de gerar recursos ao governo para a expansão do setor elétrico, a contribuição era cobrada na conta de luz dos clientes com consumo superior a dois mil quilowatts/hora (kWh) por mês. A cobrança seria extinta em 1977, mas foi prorrogada até 1993.

Por lei, os consumidores poderiam depois converter os valores pagos em ações da Eletrobras. O julgamento sobre esse tema, no STJ, ocorreu em 2009. E desde lá está definido que deve haver a correção de tais créditos.

Só que os consumidores, depois disso, ingressaram com recursos alegando que a correção efetuada pela empresa foi menor do que a devida. Alguns não tiveram o total convertido em ações e, por isso, ainda têm valores a receber.

O julgamento que está suspenso por pedido de vista na 1ª Seção envolve a Decoradora Roma (REsp 790.288). A empresa questiona a data final de aplicação dos juros remuneratórios, fixados em 6% ao ano. Pede que sejam aplicados até o efetivo pagamento, enquanto a Eletrobras defende a data da última assembleia de conversão, que ocorreu em 2005.

Os empréstimos compulsórios estão no centro de outra ação, também pendente de julgamento na Corte, em que a Eletrobrás duela diretamente com a União. A companhia pede para que o governo dívida com ela os valores que ainda terão de ser pagos aos consumidores em razão do empréstimo compulsório.

“Esses julgamentos são só a ponta do iceberg. Se fizer um pente-fino é capaz de a conta [do que cobram da União] dar mais de trilhão”, diz Aílton Soares de Oliveira, especialista em direito público e sócio do escritório A. Soares De Oliveira e Ponciano Advogados.

FONTE: Valor Econômico – Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon

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